Celebrações litúrgicas distintas sucedem-se no calendário católico

Igreja evoca todos os santos antes de recordar os fieis defuntos

A Igreja celebra esta terça feira, dia 1, a solenidade litúrgica de Todos os Santos, na qual lembra conjuntamente “os eleitos que se encontram na glória de Deus”, tenham ou não sido canonizados oficialmente.

A data, que volta a ser feriado em Portugal depois de ter sido suspenso em 2013 pelo governo de Passos Coelho, na sequência da suspensão de quatro feriados nacionais por imposição da troika, é assinalada em todo os países católicos com celebrações próprias.

As Igrejas do Oriente foram as primeiras (século IV) a promover uma celebração conjunta de todos os santos quer no contexto feliz do tempo pascal, quer na semana a seguir.

No Ocidente, foi o Papa Bonifácio IV a introduzir uma celebração semelhante em 13 de maio de 610, quando dedicou à Santíssima Virgem e a todos os mártires o Panteão de Roma, dedicação que passou a ser comemorada todos os anos.

A partir destes antecedentes, as diversas Igrejas começaram a solenizar em datas diferentes celebrações com conteúdo idêntico.

A data de 1 de novembro foi adotada em primeiro lugar na Inglaterra do século VIII acabando por se generalizar progressivamente no império de Carlos Magno, tornando-se obrigatória no reino dos Francos no tempo de Luís, o Pio (835), provavelmente a pedido do Papa Gregório IV (790-844).

Neste dia, a liturgia apela ao chamamento feito por Cristo a cada um de nós para o seguir e, ser santo à imagem de Deus.

São João João Paulo II foi um grande impulsionador da “vocação universal à santidade”, tema renovado com grande ênfase no Segundo Concílio do Vaticano.

Segundo a tradição, em Portugal, no dia de Todos os Santos, as crianças saíam à rua e juntavam-se em pequenos grupos para pedir o ‘Pão por Deus’ de porta em porta: recitavam versos e recebiam como oferenda pão, broas, bolos, romãs e frutos secos, nozes, amêndoas ou castanhas, que colocavam dentro dos seus sacos de pano; nalgumas aldeias chama-se a este dia o ‘Dia dos Bolinhos’.

Na quarta feira, dia 2 novembro tem lugar a ‘comemoração de todos os fiéis defuntos’, que remonta ao final do primeiro milénio.

Foi o Abade de Cluny, Santo Odilão, quem no ano 998 determinou que em todos os mosteiros da sua Ordem se fizesse nesta data a evocação de todos os defuntos ‘desde o princípio até ao fim do mundo’.

Este costume depressa se generalizou: Roma oficializou-o no século XIV e no século XV foi concedido aos dominicanos de Valência (Espanha) o privilégio de celebrar 3 missas neste dia, prática que se difundiu nos domínios espanhóis e portugueses e ainda na Polónia.

Durante a I Guerra Mundial, o Papa Bento XV generalizou esse uso em toda a Igreja (1915).

É neste dia que os cristãos, por tradição, rumam aos cemitérios para honrar os seus mortos e depositar flores. Este dia é assinalado num contexto em que a Congregação para a Doutrina da Fé (Santa Sé) publicou uma instrução sobre a sepultura, recordando a proibição de espalhar as cinzas da cremação e a necessidade de conservá-las nos cemitérios ou locais sagrados.

“Para evitar qualquer tipo de equívoco panteísta, naturalista ou niilista, não seja permitida a dispersão das cinzas no ar, na terra ou na água ou, ainda, em qualquer outro lugar”, refere a instrução ‘Ad resurgendum cum Christo’ (Para ressuscitar com Cristo), assinada pelo cardeal Gerhard Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.

A Igreja Católica deixa aos fiéis, desde 1963, a liberdade de escolher a cremação do seu próprio corpo, embora prefira “a antiga tradição cristã” da sepultação.

“Mediante a sepultura dos corpos nos cemitérios, nas igrejas ou em lugares específicos para tal, a tradição cristã conservou a comunhão entre os vivos e os mortos e opõe-se à tendência a esconder ou privatizar o acontecimento da morte e o significado que ela tem para os cristãos”, explica a nota.

Àqueles que tiverem optado pela cremação, concede-se a possibilidade de celebrarem as exéquias cristãs, evitando práticas como as de espalhar as cinzas ou conservá-las fora do cemitério ou de uma igreja.

O texto apresenta uma série de indicações sobre a conservação dos restos mortais, em caso de cremação, sublinhando que esta prática “não implica uma razão objetiva que negue a doutrina cristã sobre a imortalidade da alma e da ressurreição dos corpos”.

No documento sublinha-se que a Igreja Católica exclui ainda a conservação das cinzas cremadas “sob a forma de recordação comemorativa em peças de joalharia ou noutros objetos”.

“No caso de o defunto ter claramente manifestado o desejo da cremação e a dispersão das mesmas na natureza por razões contrárias à fé cristã, devem ser negadas as exéquias, segundo o direito”, acrescenta a nota.

Salvo em “circunstâncias gravosas e excecionais”, também não é consentida a conservação das cinzas em casa; mesmo nos casos em que isso aconteça, refere-se que as mesmas não devem ser divididas “entre os vários núcleos familiares”.

“Quaisquer que sejam as motivações legítimas que levaram à escolha da cremação do cadáver, as cinzas do defunto devem ser conservadas, por norma, num lugar sagrado, isto é, no cemitério ou, se for o caso, numa igreja ou num lugar especialmente dedicado a esse fim determinado pela autoridade eclesiástica”, insiste a Santa Sé.

A nova instrução sustenta que as orientações agora divulgadas pretendem evitar o “risco de afastar os defuntos da oração e da recordação dos parentes e da comunidade cristã”, ou “práticas inconvenientes ou supersticiosas”.

A Santa Sé rejeita que a cremação possa servir para promover nos católicos conceções “erróneas” sobre a morte, como a do “aniquilamento definitivo”, a “fusão com a Mãe natureza”, uma “etapa no processo da reincarnação” ou a “libertação definitiva da ‘prisão’ do corpo”.

“Enterrando os corpos dos fiéis defuntos, a Igreja confirma a fé na ressurreição da carne e deseja colocar em relevo a grande dignidade do corpo humano como parte integrante da pessoa da qual o corpo condivide a história”, pode ler-se.

Em 2006 foi publicado em Portugal o novo Ritual das Exéquias, com a principal novidade da presença de um capítulo especialmente orientado para o caso em que se faz a cremação do cadáver.

 

 

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