Cónego Manuel Carlos Alves proferiu a conferência inaugural da 22ª edição das Grandes Festas do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada, que arrancaram esta quinta-feira na Igreja Matriz de São Sebastião

Na conferência inaugural da XXII edição das Grandes Festas do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada, o reitor do Santuário do Senhor Santo Cristo dos Milagres deixou uma reflexão profunda sobre a origem, evolução e atualidade desta expressão maior da religiosidade açoriana.
Destacando que, apesar das nuances que variam de comunidade para comunidade, “a essência não mudou”, o sacerdote sublinhou que a caridade, a igualdade ontológica e a alegria na união com Deus continuam a ser os pilares das festividades.
“Os pobres e a alegria eram as prioridades. E devem continuar a sê-lo”, afirmou.
Recorrendo a fontes históricas, de Joaquim de Fiori aos escritos de Luís Bernardo Leite de Ataíde, o reitor traçou a origem do culto nos Açores desde o século XV, mencionando a presença de impérios do Espírito Santo em Santa Maria, Angra (1492), Praia da Vitória (1523) e no Nordeste, graças ao povoamento português e à ação missionária dos franciscanos.
Referiu também o desconforto que estas festas causaram à Diocese de Angra em 1559, quando nas “Constituições do Bispado” se tentou limitar o seu crescimento devido aos gastos excessivos e práticas consideradas supersticiosas. Ainda assim, o culto resistiu e foi reavivado com força, nomeadamente a partir de 1665, com o envolvimento dos Condes da Ribeira Grande. Em 1666, o pequeno D. José da Câmara foi coroado imperador numa festa onde 144 pobres participaram num banquete – gesto de grande simbolismo e solidariedade.
O reitor alertou também para os desafios modernos. O risco de transformar as festas em entretenimento turístico, dissociado da fé, e que é real e preocupante.
“Se se olhar para essa devoção como um entretenimento para turistas, vende-se a alma. E acaba por saber tão mal…”, advertiu.
Reconheceu que existem abusos e ostentações em algumas celebrações, mas valorizou a emergência de iniciativas sociais para angariar fundos e manter a dignidade da festa.
“Há todo um movimento cultural que importa defender e passar de geração em geração”, frisou, mencionando que muitas artes associadas às festas, como certos pratos típicos ou o uso do forno de lenha, estão em risco de desaparecimento.
Numa mensagem alinhada com o Ano Jubilar de 2025, dedicado à Esperança, o reitor concluiu sublinhando que a festa deve impulsionar valores cristãos universais: paz, solidariedade, dignidade humana, fraternidade e amor incondicional.
“A era do Espírito Santo não pode ficar limitada às suas festividades”, afirmou.
“Devemos ganhar aceleração e limpidez no olhar para continuarmos a construir um mundo melhor”, concluiu.
As Grandes Festas do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada realizam-se de 10 a 13 de julho com cerca de 30 eventos, entre os quais a partilha popular das sopas, o cortejo etnográfico e a coroação dos Impérios, revelou a autarquia que é a sua promotora.
O presidente da Câmara Municipal, Pedro Nascimento Cabral, numa nota divulgada pelo município afirma que o Divino Espírito Santo “marca a identidade dos açorianos enquanto povo” .
Na edição de 2024 as Grandes Festas do Divino Espírito Santo receberam o selo ambiental de Evento Circular, na categoria de Prata, pelas boas práticas implementadas em matéria de sustentabilidade, circularidade e preservação ambiental.
Com uma programação que inclui cerca de 30 eventos ao longo de quatro dias, as festas arrancaram esta quinta-feira , com a inauguração da exposição de fotografia Divino em Objetiva 23, uma mostra da Associação de Fotógrafos Amadores dos Açores.
No mesmo dia foi inaugurada a tenda do Espírito Santo de Alenquer e apresentado o livro “Ruralidade Micaelense” de Renato Cordeiro, tendo o dia ficado completo com a conferência proferida pelo cónego Manuel Carlos Alves. O momento foi seguido pelo concerto da Sinfonietta de Ponta Delgada, que estreou a “Cantata Festiva para as Festas do Divino Espírito Santo”, do compositor Sérgio Azevedo.
No dia 11, decorre a tradicional Mudança da Bandeira do Divino Espírito Santo, seguindo-se a abertura do Quarto do Espírito Santo, no Salão Nobre dos Paços do Concelho, o tradicional concurso de massa sovada, arrematações e atuações musicais.
No dia 12 de julho, sábado, as Instituições Particulares de Solidariedade Social receberão as pensões (cabazes alimentares) e, ao meio-dia, será inaugurado o Triato do Espírito Santo, no Campo de São Francisco. Este dia será também marcado pela distribuição gratuita das sopas do Espírito Santo, no Campo de São Francisco, e o Cortejo Etnográfico das 24 freguesias do concelho, assim como a recitação do Terço Cantado pelos Ranchos de Romeiros da Relva e Candelária.
À noite, os destaques musicais incluem Jorge Ferreira e os grupos Brumas da Terra e Lads d’Alenquer.
No dia 13, a Missa da Coroação terá lugar na Praça Gonçalo Velho, devido às obras que decorrem na Torre Sineira da Matriz, seguindo-se o Bodo de Leite e a Grande Coroação dos Impérios do Espírito Santo do concelho de Ponta Delgada, que percorrerá várias ruas da cidade.
A programação encerra com concertos da fadista Raquel Dutra e da Orquestra Ligeira de Ponta Delgada, ambos na Praça do Município.