Os três seminaristas açorianos destacam “amadurecimento e riqueza de experiências” como marcas do primeiro ano de formação no Porto

Afonso Silveira, Elson Medeiros e David Carreiro fazem balanço positivo da experiência fora da Diocese de Angra, apesar das dificuldades iniciais de adaptação

Foto: Igreja Açores/CR

Os três seminaristas açorianos que frequentam o Seminário de Nossa Senhora da Conceição, no Porto, consideram que o primeiro ano de formação foi marcado por desafios de adaptação, exigência académica e pastoral, mas sobretudo por um crescimento humano que descrevem como de “amadurecimento” no seu caminho vocacional.

Para Afonso Silveira, a mudança para o Porto trouxe inevitáveis dificuldades iniciais, próprias de qualquer processo de adaptação, mas que se revelaram fundamentais para o “amadurecimento”.

“O amadurecimento foi, sem dúvida, a palavra que melhor resume este ano. Como no próprio crescimento físico, há dor, mas ela conduz a um maior fortalecimento”, sublinha.

Também Elson Medeiros reconhece que “todos os inícios custam”, mas valoriza o caminho percorrido. Apesar da exigência académica, marcada pela necessidade de condensar conteúdos, considera que a experiência trouxe uma riqueza particular, nomeadamente pelo acolhimento das famílias de Leça da Palmeira, junto das quais os seminaristas viveram os fins de semana: “Essas famílias tornaram-se verdadeiras famílias de sangue, sempre disponíveis para o que precisássemos”.

Já David Carreiro, o único aluno a terminar o ano propedêutico, que não tinha tido experiência prévia de vivência comunitária no Seminário de Angra, descreve este ano como uma etapa de preparação e de adaptação progressiva, em que procurou “viver um dia de cada vez” e superar as dificuldades próprias do início de caminhada, que se pautou pelo início de um novo percurso fora de casa.

“Ao contrário dos meus colegas este ano não foi muito diferente do anterior pois no meu primeiro ano no Seminário de Angra também vivi á distância em casa. Por isso, não tinha a experiência de viver no seminário o que se calhar tornou esta mudança diferente. Há um período de adaptação,  mas como o de qualquer estudante que sai de casa e vai para a universidade”, refere.

A riqueza do encontro entre dioceses

Um dos aspetos mais valorizados pelos seminaristas foi o contacto com outras dioceses e a possibilidade de viver uma formação mais ampla.

Afonso Silveira realça que, no Porto, tiveram a oportunidade de conhecer outras realidades eclesiais e culturais: “O simples facto de nos inserirmos noutra diocese já é de uma riqueza incomensurável”.

“Enquanto estivemos no Seminário de Angra, estávamos um pouco fechados sobre nós próprios, era só a nossa realidade e a diocese, não conhecíamos a realidade também do país, de certa forma também unida por algum tipo de coesão cultural, e isso agora começa a ser mais visível, e isso é um fruto muito positivo, que sem dúvida pesa muito, e que antes era praticamente ausente. E é esta sensibilidade de que há coisas que nos unem e diferenças que nos enriquecem que nos faz crescer. Portanto, a mudança para o Porto, ou para outro sítio qualquer, teria sido sempre uma solução que reverteria em nosso  favor no nosso crescimento, quer na dimensão humana, quer na vivência comunitária, quer na própria formação académica, porque nos abre outros mundos” referiu.

Elson Medeiros, por sua vez, destacou a importância de haver uma maior representatividade das dioceses que têm alunos no Seminário do Porto na equipa formadora instituição, defendendo, em concreto, que uma presença mais direta da Diocese de Angra poderia facilitar o acompanhamento, a integração e o diálogo.

“Durante todo o processo, o Padre Emanuel Valadão Vaz, o nosso reitor do Seminário de Angra, sempre esteve disponível. Ele faz, pelo menos, três visitas por ano e liga oportunamente para falar connosco. Portanto, não fomos abandonados pelo Seminário de Angra” afirmou Elson Medeiros. No entanto, prossegue, “uma coisa é sermos acompanhados por visitas regulares ao Porto do nosso reitor do Seminário de Angra, outra coisa é termos lá no seminário alguém que nos entenda, que entenda as nossas dificuldades, as nossas dúvidas, e que possa também facilitar o diálogo com os outros membros de equipa formadora” sublinhou ainda, numa ideia que é acompanhada pelos colegas.

“Lá também temos a equipa formadora que nos acompanha e que vai prestando contas, certamente, à equipa de Angra. Eu só acho que esta mudança foi brusca, no sentido em que, a meu atender, não se analisou, de forma mais aprofundada, outras opções” refere o seminarista, que juntamente com o Afonso Silveira,  concluiu o ciclo da licenciatura preparando-se para o início do mestrado.

“Se há alguns anos atrás se disse que o Seminário de Angra  tinha laivos tridentinos, agora, revelou-se que não era bem assim. Fora isto, a experiência lá fora enriqueceu-nos muito”, disse.

Por outro lado, a “experiência da Faculdade, a meu ver, fez-nos muito bem, até porque tivemos a oportunidade e temos de contactar com meios académicos, com maiores critérios da cientificidade, que nos apresentam novos desafios, que nos fazem conhecer novas coisas e procurar conhecer e saber mais. Também vamos ter a oportunidade de fazer uma tese, de investigar, e tudo isto contribui para este grande objetivo, que é sermos pastores de igreja e profundos conhecedores das sagradas ciências” afirmou Elson Medeiros.

Perspetivas de futuro e desafios

Quanto ao futuro, os três reconhecem  “alguma incerteza” sobre as etapas seguintes, mas partilham a expectativa de aprofundar a formação académica e espiritual.

Afonso Silveira manifesta a preocupação com a escolha do tema da tese de mestrado, mas encara com entusiasmo a possibilidade de investir mais na vida interior: “O cristão do futuro, ou será místico, ou então não será nada” afirma recordando o teólogo Karl Rahner. No próximo ano,  a densidade da carga horária letiva será aliviada e haverá dois dias da semana, para além do fim-de-semana, em que não terão aulas.

“Mais tempo livre significa mais tempo para aprofundarmos a nossa espiritualidade”, diz.

Elson Medeiros acrescenta que a tese será um grande desafio, mas também uma oportunidade de maior aprofundamento da Teologia, enquanto David Carreiro encara o próximo ano com confiança, consciente das exigências que o Seminário Maior lhe colocará. O David Carreiro irá frequentar o primeiro ano de Teologia na Universidade Católica do Porto, o que conciliará com a vida no Seminário e alguma atividade pastoral durante o fim-de-semana. Este ano letivo esteve na paróquia das Antas, no coração da cidade onde desenvolveu trabalho pastoral tendo sido acolhido por famílias locais.

Este ano, o Seminário Episcopal de Angra voltará a ter quatro alunos no Porto com a entrada de mais um jovem açoriano para o ano propedêutico. No final do ano, um dos quatro seminaristas que tinha iniciado o ano letivo no Porto, também no ano propedêutico, saíu.

Em junho do ano passado e depois da decisão do Conselho Presbiteral, chancelada pelo bispo de Angra, o Seminário de Angra enviou quatro dos cinco alunos para o Porto, para completarem as duas etapas  da sua formação, continuando a ser acompanhados pelo Seminário Episcopal, que mantém a sua atividade nos Açores. De toda a comunidade educativa apenas um aluno preferiu continuar em Angra, completando aí o seu ciclo de estudos. Fábio Silveira, o mais velho dos cinco alunos, natural do Pico,  esteve no último ano integrado nas paróquias da Fonte Bastardo e São Sebastião, na ilha Terceira, mantendo as aulas no Seminário de Angra. Este ano desenvolverá o seu estágio pastoral, mais aprofundado, na ouvidoria da Povoação, na ilha de São Miguel.

Esta foi, de resto, uma das prerrogativas salvaguardadas: todos os alunos que completam os estudos no Seminário do Porto, enviados pela diocese de Angra, a ela voltarão para fazer o ano pastoral e o ano de estágio.

O Seminário Episcopal de Angra não se resume nem se esgota na formação teológica dos jovens, destacando-se a formação contínua dos sacerdotes e a dos leigos. Aliás, juntamente com o Serviço de Coordenação Diocesano de Formação, o Seminário irá promover um Curso Básico de Teologia para leigos e também formação adequada para determinados ministérios laicais.

O Seminário diocesano continua também a acompanhar todos os jovens candidatos no pré-seminário, esperando um número de candidatos considerado “razoável e suficiente” para formar uma comunidade, dentro dos números apontados pelo Vaticano.

Esta instituição de ensino e formação foi inaugurada no dia 9 de novembro de 1862, no Convento de São Francisco de Angra, depois de 328 anos da fundação da Diocese de Angra, e dava cumprimento à “norma tridentina e ao desejo do clero quanto à fundação de um seminário”.

Scroll to Top