Centro João XXIII: 45 anos de apoio social em Ponta Delgada

“Hoje as famílias vivem pior e com mais dificuldades por causa de todas as despesas” diz a diretora executiva, Andreia Gonçalves

O Centro de Bem-Estar Social João XXIII, em Ponta Delgada, fundado em 1979, é uma das instituições que integra a vasta rede de apoio social existente na maior cidade açoriana, na ilha de São Miguel.

Ao lado dos Centros Sociais e Paroquiais, criados pela Igreja, estas estruturas- Centros de Bem-estar Social e Centros de Dia- formam dois pilares essenciais no combate à exclusão e na promoção da solidariedade.

“Este Centro pode ser apresentado como uma casa acolhedora, que faz o bem e lança os nossos jovens num futuro promissor”, resume Andreia Gonçalves, diretora executiva da instituição, onde trabalha há 25 anos.

Os Centros de Bem-Estar Social (CBES), uma das formas que as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) assumem na região e no país, nascem de iniciativas autónomas — associações ou movimentos locais — mas partilham com os Centros Sociais e Paroquiais (CSP) a missão de apoiar a comunidade, funcionando como o “braço social” da Igreja Católica, embora os primeiros atuem com maior autonomia, mas sempre inspirados pelos mesmos valores de solidariedade.

No Centro de Bem-estar Social João XXIII, afeto à Igreja Matriz de São Sebastião, a paróquia do Coração da cidade de Ponta Delgada, as respostas incluem creche, jardim de infância e atividades de tempos livres até aos dez anos.

A instituição acolhe cerca de 150 crianças, desde bebés com quatro meses (8 bébés) até aos dez anos de idade, através da creche, do jardim de infância e do ATL (47 crianças dos 6 aos 10 anos de idade). Paralelamente, mantém uma parceria com a Conferência Vicentina da Matriz de São Sebastião, que assegura o acompanhamento e apoio direto a famílias em dificuldades.

Segundo Andreia Gonçalves, o apoio não se limita apenas às crianças inscritas na creche.

“As refeições dos miúdos são confecionadas cá. O excedente não vai para o lixo, entregamos a famílias carenciadas. Muitas vezes fazemos esta abordagem através do Movimento dos Vicentinos da paróquia, para que as pessoas não se sintam melindradas.”

Novas vulnerabilidades

Se os CSP estão habituados a lidar com situações de pobreza estrutural, este centro como outros CBES, identifica hoje novos públicos em dificuldade: a “classe média trabalhadora”.

A responsável destaca que, nos últimos anos, têm aumentado os pedidos de ajuda de famílias que tradicionalmente não se encontravam em situação de vulnerabilidade.

“Percebe-se que há muita família da classe média a precisar de atenção. São famílias que trabalham, mas que não ganham o suficiente para fazer face às necessidades. Hoje as famílias vivem muito pior, muito pior mesmo”, alerta.

Os encargos da creche são gratuitos para as famílias para crianças até aos três anos, mas o jardim de infância já implica mensalidades entre 6,5 e 125 euros, ajustadas ao rendimento dos pais, tal como o ATL. No entanto, Andreia Gonçalves considera que “estas tabelas já deveriam ter sido revistas há muito tempo”.

“Estas tabelas já deveriam ter sido revistas há muito tempo. A realidade económica de há 25 anos não é a de hoje. Sinceramente, os pais estão a ser lesados.”

Com 30 funcionários, o Centro de Bem Estar Social João XXIII enfrenta, tal como muitas instituições com o seu carisma, dificuldades financeiras e escassez de recursos humanos especializados. A pressão é ainda maior no acompanhamento de crianças com necessidades educativas especiais.

“Temos quatro crianças com necessidades educativas especiais, duas delas autistas não-verbais, que exigem muito da nossa equipa. Precisamos de estabilidade, mas faltam apoios para contratar mais gente”, lamenta.

Apesar das dificuldades, a diretora reforça que o espírito da instituição assenta em valores de partilha e proximidade.

“Às vezes perdemos meia hora para ter cinco minutos a falar com uma mãe, porque naquele dia ela precisava de desabafar. Este é também um trabalho de carinho, de um abraço, de saber ouvir”, diz.

Futuro em aberto

Questionada sobre os principais desafios, Andreia Gonçalves não hesita: “Infelizmente, o dinheiro resolvia tudo. Com os recursos adequados, conseguiríamos criar todas as condições necessárias para termos a instituição ideal — para as crianças, para nós e para as famílias.”

As limitações financeiras e por vezes a falta de acompanhamento governamental por parte dos serviços oficiais não impedem contudo a diretora de assegurar que o Centro de Bem-estar social João XXIII continuará a ser uma referência de apoio em Ponta Delgada, mantendo as suas portas abertas a todas as crianças, independentemente da sua condição ou religião. Uma garantia que se entende ao próprio pessoal docente pois esta é a única instituição que tem uma invisual como educadora infantil, com licenciatura e mestrado.

“Foi uma aposta nossa e os pais estão muito satisfeitos” refere.

“A integração foi plena e hoje sentimos que é uma mais valia para a instituição porque tem uma sensibilidade especial para as crianças, é apoiada por todos os técnicos e auxiliares da instituição e todos contribuem para que o espírito de entre-ajuda prevaleça”, refere Andreia Gonçalves lembrando que a formação e a dedicação são fundamentais na instituição.

Na Diocese de Angra existem 56 Centros Sociais e Paroquiais, alguns deles a funcionar apenas como Centros de Convívio de Idosos mas outros a funcionar como centros de Dia, Creche, Jardim de Infãncia e ATL, sendo uma resposta supletiva às funções do Estado.

Esta reportagem alargada sairá no programa de Rádio Igreja Açores, deste domingo, depois do meio dia na Antena 1 Açores e no Rádio Clube de Angra.

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