
A segunda comissão de estudo sobre o diaconado feminino reafirmou hoje o “não” à possibilidade de alargar sacramento da Ordem às mulheres, num relatório divulgado pelo Vaticano, após quatro anos de trabalho.
O texto, publicado por indicação de Leão XIV, admite, no entanto, que neste momento é impossível “formular um julgamento definitivo, como no caso da ordenação sacerdotal”.
“O estado da questão em volta da pesquisa histórica e da investigação teológica, consideradas nas suas implicações mútuas, exclui a possibilidade de avançar na direção da admissão das mulheres ao diaconado entendido como grau do sacramento da Ordem”, indica o relatório, citado pela Agência Ecclesia.
O diaconado é o primeiro grau do Sacramento da Ordem (diaconado, sacerdócio, episcopado), atualmente reservado aos homens, na Igreja Católica.
“As questões relativas à ordenação diaconal das mulheres permanecem em aberto para futuros aprofundamentos teológicos e pastorais, mantendo-se o princípio da ‘communio hierarchica’ [comunhão hierárquica] que atribui a decisão final sobre estas questões ao Magistério da Igreja, como resposta autorizada às questões presentes em alguns setores do Povo de Deus”, assinala o novo relatório.
Uma primeira comissão para o estudo do diaconado feminino, anunciada a 12 de maio de 2016, veio a revelar-se inconclusiva, tendo Francisco descartado mudanças no futuro imediato.
Em 2020, o Papa Francisco decidiu instituir uma nova comissão de estudo sobre o diaconado feminino na Igreja Católica, na sequência do Sínodo especial para a Amazónia, que começou a trabalhar em 2021.
O Concílio Vaticano II (1962-1965) restaurou o diaconado permanente, a que podem aceder homens casados (depois de terem completado 35 anos de idade), o que não acontece com o sacerdócio.
Com origem grega, a palavra ‘diácono’ pode traduzir-se por servidor, e corresponde a alguém especialmente destinado na Igreja Católica às atividades caritativas, a anunciar a Bíblia e a exercer funções litúrgicas.
A segunda comissão de estudos foi presidida pelo cardeal Giuseppe Petrocchi, arcebispo emérito de L’Aquila, na Itália, e concluiu os seus trabalhos em fevereiro passado.
O relatório, de oito páginas, foi enviado a Leão XIV no último dia 18 de setembro passado e é agora tornado público por vontade do Papa.
O cardeal Petrocchi sublinha, nas conclusões, que existe “uma intensa dialética” entre duas orientações teológicas.
A primeira afirma que a ordenação do diácono é para o ministério e não para o sacerdócio, o que “abriria o caminho para a ordenação de diaconisas”.
A segunda, por outro lado, insiste “na unidade do sacramento da ordem sagrada, juntamente com o significado esponsal dos três graus que a constituem, e rejeita a hipótese do diaconado feminino”.
Para o presidente da comissão, é indispensável “uma análise crítica rigorosa e alargada sobre o diaconado em si mesmo, ou seja, sobre a sua identidade sacramental e a sua missão eclesial, esclarecendo alguns aspetos estruturais e pastorais que atualmente não estão totalmente definidos”.
O relatório recorda que, em várias partes da Igreja, o ministério diaconal é “quase inexistente” e noutros locais assume missões que, muitas vezes, “coincidem com os papéis próprios dos ministérios leigos ou dos ministrantes na liturgia”.
A primeira comissão já tinha concluído que a Igreja reconheceu o título de “diácono/diaconisa” em diferentes épocas e lugares, mas com um “significado não unívoco”.
O consenso mais forte nesta segunda comissão, com nove votos a favor e um contra, registou-se na recomendação de alargar “o acesso das mulheres aos ministérios instituídos para o serviço da comunidade”.
Este passo deve garantir “um reconhecimento eclesial adequado à diaconia dos batizados, em particular das mulheres”, sendo visto como um “sinal profético”, especialmente onde as mulheres sofrem situações de discriminação de género.
“É necessário, além disso, sublinhar que as diferentes Comissões foram unânimes em assinalar a necessidade de ampliar os ‘espaços de comunhão’ para que as mulheres possam expressar uma participação adequada e uma corresponsabilidade nos centros de decisão da Igreja, também através da criação de novos ministérios laicais.”
Num comentário pessoal, o cardeal Petrocchi sustenta que “as declarações contraditórias das ‘escolas’ teológicas e a falta de convergência sobre polaridades doutrinárias e pastorais fundamentais motivam, na minha opinião, a manutenção de uma linha de avaliação prudente sobre o tema do diaconado feminino”.
O responsável recomenda investigações de “alcance global”, com “sabedoria e visão de futuro, para sondar estes horizontes eclesiais”.
O atual Papa recordou, na primeira entrevista do pontificado, que a questão vem sendo estudada há “muitos anos”, perspetivando que “continuará a ser um problema”.
“Por que falaríamos em ordenar mulheres ao diaconato se este, em si mesmo, ainda não é bem compreendido e não foi adequadamente desenvolvido e promovido dentro da Igreja?”, questionava Leão XIV, em declarações ao portal norte-americano ‘Crux’.
O pontífice descartou qualquer “intenção de mudar o ensinamento da Igreja sobre o assunto”.
| O documento final da XVI Assembleia Geral do Sínodo, aprovado em outubro de 2024, dedicou um número específico ao ministério das mulheres, o qual mereceu o maior número de votos contra.
“Não há nenhuma razão para que as mulheres não assumam papéis de liderança na Igreja: o que vem do Espírito Santo não pode ser impedido. A questão do acesso das mulheres ao ministério diaconal também permanece em aberto. É necessário um maior discernimento a este respeito”, refere o ponto 60 do texto, que recebeu 258 votos a favor e 97 contra. Em fevereiro de 2024, Francisco decidiu criar grupos de estudo sobre dez temas propostos pela primeira sessão sinodal, em outubro de 2023, que envolvem os dicastérios da Cúria Romana, sob a coordenação da Secretaria-Geral do Sínodo, deixando assim esse debate fora do documento de trabalho. O grupo 5 é dedicado a “questões teológicas e canonísticas relativamente a específicas formas ministeriais”, em particular sobre a participação das mulheres nos processos de decisão e liderança comunitária. |
(Com Ecclesia e Vatican News)