
Leão XIV afirmou hoje que o Natal coloca a humanidade diante da sua responsabilidade perante quem sofre, pedindo a superação da “indiferença”.
“Não nos deixemos vencer pela indiferença em relação a quem sofre”, disse, desde a varanda da Basílica de São Pedro, antes de conceder a bênção ‘Urbi et Orbi’ (à cidade [de Roma] e ao mundo).
Na sua primeira mensagem de Natal, Leão XIV deixou um convite a abrir o coração aos necessitados.
“Neste santo dia, abramos o nosso coração aos irmãos e irmãs que passam necessidades e sofrem. Ao fazê-lo, abrimos o nosso coração ao Menino Jesus, que, com os braços abertos, nos acolhe e revela a sua divindade”, afirmou.
Antes de elencar os vários conflitos e crises humanas que atingem a humanidade, o pontífice apresentou uma reflexão teológica sobre a liberdade humana e a necessidade de conversão pessoal como pré-requisito para a paz global.
“Deus, que nos criou sem nós, não pode salvar-nos sem nós, isto é, sem a nossa livre vontade de amar. Quem não ama não se salva, está perdido”, declarou, citando Santo Agostinho.
Para o Papa, a celebração do nascimento de Jesus é mais do que um evento sentimental, representando a revelação de uma escolha divina pela fragilidade e pela partilha da condição humana.
“Por amor, desejou nascer de uma mulher, para partilhar a nossa humanidade; por amor, aceitou a pobreza e a rejeição e identificou-se com quem é descartado e excluído”, referiu.
Leão XIV explicou que Cristo mostrou o caminho da responsabilidade, que implica o reconhecimento das próprias falhas antes de apontar o dedo aos outros.
“Se cada um de nós, a todos os níveis, em vez de acusar os outros, reconhecesse em primeiro lugar as próprias falhas, pedisse perdão a Deus e, ao mesmo tempo, se colocasse no lugar dos que sofrem (…), então o mundo mudaria”, sustentou.
Na reta final do Jubileu da Esperança, que se encerra a 6 de janeiro de 2026, o Papa recordou que o fecho da Porta Santa deixa uma mensagem de futuro.
“Em poucos dias, o Ano Jubilar terminará. As Portas Santas fechar-se-ão, mas Cristo, nossa esperança, permanecerá sempre connosco. Ele é a Porta sempre aberta, que nos introduz na vida divina”, assinalou.
A intervenção destacou ainda que a paz verdadeira começa na limpeza do coração, pois “sem um coração livre do pecado, um coração perdoado, não se pode ser homens e mulheres pacíficos”.
“Jesus assume a nossa fragilidade, identifica-se com cada um de nós: com aqueles que não têm mais nada e perderam tudo, como os habitantes de Gaza”, declarou, na sua primeira mensagem de Natal, antes da bênção ‘Urbi et Orbi’ (à cidade [de Roma] e ao mundo), desde a varanda da Basílica de São Pedro.
Leão XIV assumiu preocupações com o Médio Oriente, recordando a sua recente viagem à região, com passagem pelo Líbano, e o sentimento de “impotência” das populações locais.
“Neste dia de festa, desejo enviar uma calorosa saudação paterna a todos os cristãos, em especial àqueles que vivem no Médio Oriente e que recentemente, na minha primeira viagem apostólica, desejei encontrar. Ouvi os seus receios e conheço bem o seu sentimento de impotência perante dinâmicas de poder que os ultrapassam”, declarou.
“De Jesus invocamos justiça, paz e estabilidade para o Líbano, a Palestina, Israel e a Síria”, acrescentou.
Perante milhares de pessoas reunidas na Praça de São Pedro, numa manhã de chuva, o pontífice citou o poeta israelita Yehuda Amichai (1924–2000) para rejeitar uma paz meramente burocrática.
“Não a paz de um cessar-fogo, nem a visão do lobo e do cordeiro, mas antes como quando no coração a excitação termina e apenas se pode falar de um grande cansaço. […] Venha de repente, como as flores selvagens, porque o campo precisa dela: paz selvagem”, disse, recitando o poema “Wildpeace” (Paz Selvagem).
O Papa abordou ainda a situação no leste europeu, apelando ao silêncio das armas.
“Rezemos de modo especial pelo povo ucraniano tão massacrado: que o barulho das armas acabe e que as partes envolvidas, apoiadas pelo empenho da comunidade internacional, encontrem a coragem de dialogar de modo sincero, direto e respeitoso”, exortou.
“Ao Príncipe da Paz, entregamos o inteiro continente europeu, pedindo-lhe que continue a inspirar um espírito comunitário e colaborativo, fiel às suas raízes cristãs e à sua história, solidária e acolhedora com quem passa necessidade”, acrescentou.
A lista de conflitos e crises humanas abrangeu vários continentes, com referência às “guerras esquecidas”, nomeando o Sudão, Sudão do Sul, Mali, Burquina Faso e a República Democrática do Congo.
Leão XIV deixou uma saudação aos que “sofrem por causa da injustiça, da instabilidade política, da perseguição religiosa e do terrorismo”.
Sobre a América Latina, o pontífice pediu aos responsáveis políticos que “deem espaço ao diálogo pelo bem comum e não a preconceitos ideológicos”, e solicitou orações específicas pelo Haiti, para que cesse “toda a forma de violência”.
O Papa apelou ainda à reconciliação em Myanmar e ao restabelecimento da “antiga amizade entre a Tailândia e o Camboja”.
Leão XIV deixou palavras de solidariedade a “quem está a braços com a fome e a pobreza, como o povo do Iémen” e aos que fogem da própria terra em busca de um futuro noutro lugar, “como os muitos refugiados e migrantes que atravessam o Mediterrâneo ou atravessam o continente americano”.
A intervenção recordou também os que perderam o trabalho e os que o procuram, “como tantos jovens que têm dificuldade em encontrar emprego”, além dos que “são explorados, como muitos trabalhadores mal remunerados”.
A mensagem de Natal estendeu-se aos que estão na prisão e, “muitas vezes, vivem em condições desumanas”.
A mensagem de Natal deixou com um apelo à responsabilidade individual e coletiva para travar o ódio e a violência.
“Jesus Cristo é a nossa paz porque, em primeiro lugar, nos liberta do pecado e, em segundo lugar, nos indica o caminho a seguir para superar os conflitos, quaisquer que sejam, desde os interpessoais aos internacionais”, referiu o Papa.
A bênção ‘Urbi et Orbi’ foi precedida pela execução dos hinos do Vaticano e da Itália, pelas bandas da Gendarmaria Pontifícia e dos Carabinieri, com as saudações militares da Guarda Suíça e das Forças Armadas italianas.
“Desejo a todos, de coração, um feliz e santo Natal”, concluiu.
Antes de bênção, Leão XIV recuperou hoje a tradição das saudações natalícias em várias línguas, dirigindo-se aos milhares de fiéis presentes e aos que acompanhavam a transmissão pelos media em dez idiomas, incluindo o português.
“Feliz Natal! Que a paz de Cristo reine nos vossos corações e nas vossas famílias”, desejou.
A última vez que esta tradição tinha sido cumprida foi no Natal de 2012, quando Bento XVI apresentou saudações em 65 idiomas.
“Um estábulo pode tornar-se mais sagrado do que um templo”, afirmou o Papa
(Com Ecclesia)