Ana Cristina Ribeiro leva esperança às mulheres reclusas de Angra

“No deserto humano que é uma cadeia pode nascer Cristo”, afirma catequista

Foto: Igreja Açores/CR

Há dois anos a acompanhar espiritualmente mulheres no Estabelecimento Prisional de Angra, Ana Cristina Ribeiro descreve a prisão como um “deserto humano” marcado pela solidão, culpa e medo, mas também como um espaço onde é possível reconstruir a dignidade, fortalecer a fé e criar esperança através da comunidade e da oração.

Numa entrevista que vai para o ar este domingo, depois do meio-dia na Antena 1 Açores e no Rádio Clube de Angra, e que pode ser ouvida em podcast aqui no Sítio Igreja Açores a partir deste domingo, Ana Cristina Ribeiro, catequista e leiga carmelita da Ordem Terceira Secular do Carmo, afirma que as mulheres que chegam ao Estabelecimento Prisional de Angra fazem-no, muitas vezes, “bastante desorientadas”, deixando filhos e famílias para trás e enfrentando um profundo sentimento de vazio. É neste contexto que Ana Cristina Ribeiro desenvolve a sua missão como catequista, procurando levar conforto espiritual e sentido de comunidade a quem vive a privação da liberdade.

“Às vezes é no deserto que encontramos o terreno propício para que Jesus Cristo nasça”, afirma, sublinhando que a prisão “é um espaço de grande solidão, mas também um lugar onde a esperança pode ser semeada”.

Muitas das reclusas cumprem pena por tráfico de droga, furtos ou crimes mais graves, sendo frequente o arrependimento e a culpa associados a histórias de desemprego, pobreza e desestruturação familiar.

O trabalho pastoral passa pela meditação do Evangelho, oração comunitária e leitura espiritual.

“Facultamos Bíblias, livros como A Imitação de Cristo, fazemos meditação e levamos terços e orações”, explica. Um dos projetos mais marcantes é a transmissão diária do Terço, às 21h00, em parceria com o Rádio Clube de Angra. “Elas acompanham o Terço na cadeia e dão-nos um feedback muito positivo. Isso fortalece a fé e dá-lhes esperança.”

Ana Cristina destaca ainda a importância de criar um espírito de comunidade entre as reclusas.

“Partilham os mesmos medos e dificuldades. Fazer comunidade, escutarem-se e ajudarem-se mutuamente faz toda a diferença no dia-a-dia”, diz.

Para a catequista, a mensagem é clara: “Se Deus te plantou aqui, faz a diferença aqui.”

Apesar das limitações como a impossibilidade de realizar atividades pastorais ao fim de semana,  os voluntários continuam a apoiar as reclusas através de campanhas solidárias.

Este ano, a iniciativa “Pequenos Gestos até à Liberdade”, desenvolvida por um grupo de jovens da Escola Básica e Integrada de Angra,  permitiu recolher cerca de 300 pares de meias, envolvendo escolas, paróquias e movimentos da Igreja.

“A comunidade foi muito generosa”, refere, acrescentando que o gesto foi estendido também aos guardas prisionais, “que merecem reconhecimento pela disponibilidade e humanidade”.

Na entrevista, que pode ouvir na íntegra em podcast este domingo, a catequista sublinha ainda a mensagem deixada pelo bispo de Angra sobre a dignidade humana, afirmando que esta é plenamente sentida pelas reclusas.

“Uma delas podia ser eu, sem a graça de Cristo. Elas são tão dignas como eu ou qualquer outra pessoa.”

Para Ana Cristina, ver a pessoa para além da reclusão é uma exigência cristã fundamental, “na cadeia e na vida concreta cá fora”.

Sobre o pontificado do Papa Francisco, que sempre deu uma especial atenção às cadeias e aos reclusos, destaca a atenção às periferias, reinterpretando o conceito: “As periferias são todas as pessoas afastadas de Cristo. Às vezes estão fora da cadeia, não dentro.” Na sua perspetiva, há reclusos que, mesmo privados de liberdade, conseguem sair das periferias ao olhar para o outro e construir relações de solidariedade.

Apesar do empenho, Ana Cristina reconhece desafios futuros.

“É um trabalho um bocadinho solitário. Faz-me falta outra pessoa para dar catequese comigo”, admite, deixando um convite aberto a quem queira colaborar.

No meio das grades e do silêncio da prisão, a catequista acredita que pequenos gestos de fé e presença humana continuam a fazer a diferença. “Levar Cristo ali é levar esperança. E isso transforma.”

A entrevista de Ana Cristina Ribeiro vai para o ar este domingo depois do meio-dia, na Antena 1 Açores e no Rádio Clube de Angra.

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