Teólogo açoriano defende que o maior legado de Niceia é o salto na forma como a Igreja professa a sua fé trinitária

O Concílio de Niceia, realizado há 1700 anos, representa uma verdadeira “revolução teológica” na forma como os cristãos expressam a sua fé, afirmou esta manhã o padre Pedro Lima, sacerdote açoriano licenciado em Teologia Dogmática pela Pontifícia Universidade Gregoriana.
“Celebrar Niceia é celebrar uma revolução teológica, mas também a celebração da tradição viva da eclesialidade da Igreja e da sinodalidade” disse o sacerdote na conferência “Recitar com fé o Credo é entrar em comunhão com Deus Pai, Filho e Espírito Santo” (CCE 197): o dogma trinitário-cristológico-antropológico”, com a qual se iniciaram os trabalhos do segundo dia do 62º Encontro Nacional dos Secretariados Diocesanos da Catequese, que está a decorrer no Seminário Episcopal de Angra.
“O credo é o símbolo da fé: a forma que a Igreja tem de apresentar no que acredita e Niceia passou de uma declaração individual para uma declaração coletiva, isto é, já não sou só eu que creio, mas nós enquanto igreja que cremos e professamos”, afirmou o sacerdote.
Esta é “a revolução teológica e eclesiológica de Niceia” insistiu o sacerdote que atualmente é o assistente nacional LOC/MTC e JOC e pároco em Santa Lúzia de Angra.
“O concílio de Niceia em 325 vem, sobretudo, responder a Hário, que negava a divindade de Jesus, e vem dizer que o pai e o filho são consubstanciais. Nós estamos perante um concílio profundamente dogmático, que vem defender o dogma do mistério de Deus e de Cristo, mas também, ao mesmo tempo, garantir a nossa salvação, porque se dizemos que Jesus não é o filho de Deus, que o eterno é como o pai. Estamos, assim, na base do cristianismo, que é a nossa salvação”, enfatiza .
O sacerdote, que é também professor do Seminário de Angra, desafiou os catequistas a serem “hermeneutas da fé católica”, regressando as fontes mas com “ousadia” e “fidelidade”.
“Era assim que Cristo fazia, Cristo veio a apresentar e até chocou com a nova imagem de apresentar Deus perante o mundo novo. Então também a igreja tem que chocar, tem que apresentar com coragem”, disse.
Se calhar, adiantou, “ falta-nos muito o testemunho de vida, a santidade de vida, a nossa coerência, porque é isso que o mundo aprecia, ou seja, uma vida autêntica, uma vida tal como Jesus, uma vida fiel àquilo que se acredita. Talvez o grande desafio hoje é viver aquilo que acreditamos”.
“Temos de ser capazes de transmitir a fé, nesta linguagem hermenêutica, aos homens de hoje, no seu conteúdo, mas também vivendo a fé como ato, compromisso, testemunho, para que também possamos não apenas pronunciá-la em palavras, mas vivê-la em gestos”, prosseguiu procurando situarmo-nos sempre na realidade concreta do mundo de hoje, porque são de hoje os interlocutores da Igreja.
“Esta é uma tarefa exigente, difícil. Realmente, o ser hermenêutico implica perceber a realidade que nós queremos transmitir, compreendê-la, mas também conhecer aqueles a quem nós vamos transmitir esta realidade. Portanto, o grande desafio da Igreja é inserir-se na realidade que vivem hoje os jovens, as crianças e o mundo, para saber falar com a linguagem que eles falam”, disse ainda reconhecendo que embora possa ser uma linguagem “estranha, adversa, nova” a “Igreja tem de dar estes passos, de inserir-se na realidade, para falar nesta realidade de Cristo”.
De resto, o sacerdote recorda que a igreja tem sempre instrumentos, como o magistério, a Sagrada Escritura, a Tradição da Igreja, o sensus fidei, “todos no seu conjunto ajudam-nos a descodificar este mistério” que é apresentar Jesus Cristo “na sua dimensão humana, real, consubstancial a nós, e na sua dimensão divina, consubstancial ao Pai, fonte de salvação e garante de um horizonte novo à vida de cada um. Trata-se desta dimensão antropológica e humana, como Cristo vem garantir um sentido novo à vida de cada um”.
“O cristianismo é uma opção nova, radical de vida e com esta distância temporal que nos separa, é capaz de ser contemporâneo, atual, vivo e sempre desafiante. Porque a sua mensagem é esta mensagem que ainda diz hoje e diz muito à vida de cada um”, afirmou.
Ainda esta manhã o pastoralista cónego Hélder Fonseca Mendes abordará as consequências do Concílio de Niceia.
O 62º Encontro Nacional dos Secretariados Diocesanos da Catequese ‘Eu creio, nós cremos: de Niceia ao hoje da catequese’ reúne 18 secretariados diocesanos da catequese bem como dirigentes dos serviços da catequese da diocese de Angra e termina com uma celebração na catedral presidida pelo bispo de Angra.