Por António Maria Gonçalves

O ano civil inicia-se, para a Igreja, sob um sinal profundamente teológico e humano: no primeiro dia de janeiro celebramos Santa Maria, Mãe de Deus. Não se trata de uma simples coincidência de calendário, mas de uma afirmação essencial da fé cristã. Ao honrar Maria no limiar do ano, a Igreja recorda que Deus entrou no tempo, assumiu a nossa condição e quis precisar de uma Mãe. Foi precisamente esta verdade que o Primeiro Concílio de Éfeso, reunido em 431 na Igreja de Maria, proclamou solenemente ao definir o dogma da Maternidade Divina, reconhecendo Maria como Theotókos, Mãe de Deus.
Janeiro prolonga, assim, a luz do Natal. Os seus protagonistas continuam em evidência, como que convidando os fiéis a não apressarem o mistério. No dia 3 celebra-se o Santíssimo Nome de Jesus, nome que salva e revela a identidade daquele que veio habitar entre nós. No dia 6, a Epifania do Senhor manifesta Cristo como luz para todos os povos, enquanto o Batismo do Senhor, celebrado a 11 de janeiro, assinala o início da sua vida pública e recorda a nossa própria vocação batismal.
Este percurso culmina a 2 de fevereiro, com a Apresentação do Senhor no Templo, conhecida entre nós como Nossa Senhora das Candeias, da Candelária ou ainda da Estrela — uma celebração vivida com particular solenidade em várias ilhas dos Açores. A luz – sinal de Cristo que ilumina as nações, une-se à ternura de Maria que oferece o Filho, encerrando simbolicamente o ciclo natalício.
Mas janeiro não vive apenas deste fio mariano e cristológico. Ao longo do mês, a Igreja honra também numerosos santos que fazem parte da memória viva do povo. Entre eles, destaca-se Santo Antão, invocado como protetor dos animais, com especial devoção em paróquias marcadas, desde sempre, por uma forte ligação à pecuária — sustento económico, mas também expressão de uma relação respeitosa entre o homem, a terra e a criação.
Finalmente, no dia 25 de janeiro, a liturgia celebra a Conversão de São Paulo, um dos acontecimentos mais decisivos da história do cristianismo. Saulo de Tarso, perseguidor dos cristãos, encontra-se com Cristo no caminho de Damasco e vê a sua vida radicalmente transformada. De opositor passa a apóstolo; de perseguidor, a missionário incansável dos gentios. A sua conversão recorda que ninguém está fora do alcance da graça e que Deus continua a escrever direito por linhas humanas, tantas vezes tortuosas.
Assim, janeiro apresenta-se como um mês de começos: do ano, do anúncio, da missão. Um tempo que convida a Igreja — e cada cristão — a iniciar o caminho sob o olhar de Maria, à luz de Cristo e com a coragem da conversão permanente.