D. José Avelino Bettencourt presidiu este domingo à Festa do Senhor Santo Cristo da Caldeira, organizada pelo Santuário Diocesano jorgense
O Santuário Diocesano do Senhor Santo Cristo da Caldeira foi este domingo palco de uma profunda vivência espiritual, com a celebração da festa anual marcada pela homilia e sermão de D. José Bettencourt, núncio apostólico da Santa Sé nos Camarões e na Guiné Equatorial, que apelou a uma fé “efervescente” e “missionária”.
“A Igreja tem que ser sempre missionária. Tem que haver sempre algo de novo, uma efervescência na fé e na missão”, afirmou desafiando os peregrinos da caldeira a prosseguir a missão fora deste espaço, sem medo e em fidelidade a Cristo.
Na sua pregação, o diplomata da Santa Sé em África (são 54 núncios em todo o continente) alertou contra a tentação de viver um cristianismo “ligeiro”, feito à medida de conveniências pessoais.
“Não podemos ser discípulos de ocasião. A cruz é fundamental na vida do cristão. Quem quiser seguir-me, tome a sua cruz e siga-me”, citou, reforçando a necessidade de assumir a fé por inteiro, mesmo nas dificuldades.
“Não podemos ser discípulos se não estivermos dispostos a dar a nossa vida por Jesus, a dar a nossa vida pelo irmão” enfatizou ainda.
A celebração na Caldeira da Fajã de Santo Cristo, na ilha de São Jorge, foi também ocasião para destacar a dimensão peregrina da fé. O arcebispo comparou o caminho até ao santuário ao Caminho de Santiago, sublinhando que “este caminhar é um caminho espiritual” onde se encontram o céu, a terra e o mar, e onde os “cristãos são chamados ao encontro com Cristo ressuscitado”.
O diplomata deixou, assim, um forte apelo à autenticidade e à missão, exortando os fiéis a “dar sempre o melhor de si mesmos”, recordando que a Igreja, ao longo da história, conserva e transmite o melhor da arte, da ciência e da fé.
D. José Avelino Bettencourt partilhou ainda experiências pessoais da sua missão nos Camarões, descrevendo a coragem dos fiéis que percorrem longas distâncias sob risco de ataques, para participarem na missa
“Eles rezam o terço no caminho sem saber se chegarão vivos. Mas quando chegam, é uma enorme festa, como nós aqui hoje. A fé não pode ser vivida com medo, mas com coragem”, sublinhou.
No final, já durante o `sermão da praça´, D. José Avelino Bettencout deixou uma palavra de gratidão ao clero da ilha, lembrando em especial a missão do padre Dinis Silveira, pároco em Santo Antão e no Topo e ouvidor eclesiástico da ilha, com uma especial devoção a este lugar a onde dinamizava semanlamente pelo menos uma eucaristia, apontando “o seu exemplo de dedicação à comunidade jorgense”.
“Gostava de partir desta caldeira do Senhor Santo Cristo, pensando que todos nós temos vocação cristã. Todos, eu e tu. Todos nós temos uma missão. E todos nós ajudamos-nos uns aos outros na mesma missão cristã. Alguns, na igreja doméstica, na família. Alguns, na igreja paroquial, na igreja diocesana. Outros, ad extra, mas todos somos missionários”, concluiu.
A ilha e muitos jovens das designadas ilhas do triângulo- Faial e Pico- mobilizam-se em torno desta celebração. Sendo esta a última grande festa de verão das ilhas do triângulo, muitos aproveitam para aqui depositar as suas intenções antes de regressarem aos seus compromissos.
Depois do tríduo, este domingo, ponto alto da festa, realizou-se a procissão com o habitual “Sermão da Praça”, atraindo centenas de peregrinos não só de São Jorge como também da vizinha ilha do Pico. Paralelamente, o programa contemplou momentos de convívio, como o almoço comunitário de sábado, marcado pela partilha das tradicionais sopas.
A devoção ao Senhor Santo Cristo da Caldeira remonta a uma lenda local, segundo a qual a imagem teria sido encontrada por um pastor a flutuar numa lagoa. Repetidamente levada para o povoado, regressava sempre, de forma misteriosa, ao lugar da fajã. “O Santo Cristo quer estar lá em baixo na caldeira”, terá dito a população, dando origem a um culto que atravessou séculos e continua a marcar a identidade espiritual da ilha.