“O que fizemos aqui não foi apenas falar de sinodalidade mas vivê-la concretamente”- bispo de Angra

Equipa sinodal de Angra participou nas Jornadas Pastorais do Episcopado sobre sinodalidade, em Fátima

Foto: Igreja Açores

 

Falar e pôr em andamento a sinodalidade, de forma “efetiva e prática”, é o grande desafio da Igreja em Portugal  e também da Igreja diocesana, afirma o bispo de Angra, que participou nas Jornadas Pastorais do Episcopado, que terminaram esta quarta-feira em Fátima.

“Nós temos um grande desafio pela  frente, que é este de dizermos o que somos. E nós não dizemos o que somos tanto pelas grandes atividades, por aquilo que dá muito nas vistas, mas dizemos o que somos, antes de mais, na construção das relações fundamentais para caminharmos juntos e este é o desafio que se coloca na sinodalidade que é sermos práticos e concretos” afirmou ao Sítio Igreja Açores D. Armando Esteves Domingues no final dos trabalhos em que participaram também alguns dos elementos que compõem a equipa sinodal diocesana.

Durante os três dias de trabalho de grupo e partilhas refletiu-se sobre a sinodalidade e a forma como ela tem sido implementada nas dioceses, assumindo-se que é um caminho que tem ritmos diferentes.

“É interessante que eu partilhava no meu grupo que cada ritmo tem o ritmo de Deus. E os nossos tempos são tempos de Deus, portanto, aqui não há propriamente ritmos diferentes. É o ritmo que Deus coloca em cada pessoa”, afirmou o bispo de Angra.

“O meu profundo respeito pelo outro, começa precisamente a aceitar que ele vá com um passo diferente, mas  que eu sou capaz de atrasar o meu para caminhar com ele. E que sou capaz de lhe agradecer porque ele caminha mais, que o outro caminha mais depressa que eu” enfatizou ainda o prelado.

“A sinodalidade não é algo já alcançado. Mal de mim se pensasse que a nossa diocese já é sinodal. Há, efetivamente, muitas pessoas com vontade de viver sinodalmente. Darmos também este testemunho de uma Igreja a querer caminhar junto, mas com tanto ainda para andar é também muito importante”, conclui D. Armando Esteves Domingues.

“Como é que nós vamos agir para que todos os cristãos batizados se sintam também protagonistas na decisão, construtores de uma decisão, participar do poder da Igreja, como que por assim dizer é uma questão  muito concreta”, disse por outro lado.

Já o Vigário Episcopal para o Clero destaca o estilo sinodal manifestado neste encontro que reflete muito do que se está a fazer na Igreja em Portugal.

“Do ponto de vista mais concreto da nossa diocese, certamente nós precisamos de sinodalidade, embora a descontinuidade territorial, faça com que a sinodalidade se torne mais difícil, porque a comunicação é mais difícil. Agilizar a comunicação entre as ilhas, encontrar estruturas de melhor comunhão e participação é urgente e desafiante” afirma o padre José Júlio Rocha que vê na piedade popular um espaço concreto de sinodalidade.

“Nós temos na cultura popular uma das maiores riquezas da igreja, e nos Açores esta realidade ainda é mais evidente” afirma o sacerdote e a piedade popular ajuda-nos a exercitar o principio da subsidiariedade que é também uma das dimensões da sinodalidade.

“Aceitar e abraçar as iniciativas que vêm das bases, do povo, das pessoas simples, dar-lhes amplitude eclesial, criar estruturas que apoiem e que deem dimensão eclesial são oportunidades únicas” refere o sacerdote.

“A sinodalidade é uma cultura, é um espírito que se difunde sobre todas as atividades da Igreja. A escuta, a partilha, a participação, a responsabilidade, a promoção dos leigos, a luta contra os excessos de clericalismo”, afirma o padre José Júlio Rocha.

“O nosso ideal é chegarmos à altura em que já não precisamos falar de sinodalidade porque a Igreja já é toda sinodal” enfatizou.

Foto: Ecclesia/IA

“Espero que isso seja um sonho que se cumpra. E o começo está na criação de estruturas de participação de todo o Povo de Deus”, acrescentou ainda, destacando, por outro lado, que tudo isto só se concretizará se houver conversão.

“A conversão nas relações, a conversão na vivência comunitária, a conversão no modo de agir” salientou, sublinhando que o primeiro ano do triénio, que está a ser projetado, depois da Assembleia Conjunta dos membros dos Conselhos Presbiteral e Pastoral Diocesano, tem de incluir esta “intuição do papa Francisco a partir do Concílio Vaticano II”.

“Quem somos como Igreja? É o primeiro ano, o primeiro triénio da nossa caminhada para 2034. E, portanto, refletir quem somos na transparência, em tudo aquilo que nós queiramos conhecer a igreja, ter em conta que a conversão é o princípio e o fim de todas as coisas”, afirmou ao Sítio Igreja Açores, reclamando uma aposta diocesana nas “estruturas de conversão”.

“Creio que estes dias foram riquíssimos, não só porque nos ensinaram a teologia e a espiritualidade da sinodalidade como acentuaram a hora de colocar esta sinodalidade em prática” afirma, por outro lado, monsenhor José Constância.

“As questões da saber quem é Cristo hoje, como ser cristão hoje e, no caso concreto da nossa diocese, o que significa ser de Cristo hoje , sermos seus seguidores significa recuarmos, num certo sentido, ao Kairós da nossa fé” adianta frisando que  isso “vai exatamente colocar-nos a nós todos, as comunidades paroquiais, os movimentos e serviços, os padres e leigos, o povo de Deus, nesta centralidade de Cristo e numa igreja de batizados” que era “o grande sonho do Concílio”.

“Somos cristãos pelo batismo. Portanto, uma Igreja de batizados significa uma igreja que não fica amorfa, que não fica a repetir tradições, que não fica num certo indiferentismo e muito menos numa relação que é parada, que não leva a pessoa a falar com a outra, que não leva um grupo que é diferente a dialogar com o outro, que não leva a que a discordância venha de cima, porque exatamente estamos como igreja de batizados”, disse.

O sacerdote que é o diretor do Instituto Católico de Cultura lembrou ainda a questão do tempo e do ritmo da sinodalidade, amplamente identificada nos trabalhos de grupo.

“A sinodalidade é a beleza de fazermos caminho juntos em Cristo. Creio que nós atravessamos uma época, à mercê de diversas sensibilidades, diversos acontecimentos da Igreja e do mundo, que nos leva muitas vezes a estarmos distantes uns dos outros. Ou, quando estamos perto, não falamos o que devíamos falar. Não falamos a verdade com que devíamos falar na caridade. Bloqueamos e, portanto, a melhor maneira de fazermos sinodalidade é entrarmos nesta estrada de diálogo, de comunhão, a nível de paróquias, a nível de ouvidorias, a nível mesmo de diocese”, afirmou Monsenhor José Constância.

“A sinodalidade leva-nos a estarmos uns para os outros. E esta é uma primeira atitude muito necessária para mim, para todos nós e para o todo do processo. Depois, com o tempo e com a metodologia e com o caminho a fazer-se, digamos assim, a sinodalidade entrará com o estilo de vida normal”, concluiu.

Francisco Almeida Medeiros, um dos quatro leigos da Comissão Sinodal Diocesana, refere que estes dias de partilha foram úteis e sobretudo mostram que os Açores, em matéria de sinodalidade, estão a fazer caminho.

“Nós vivemos nos Açores uma verdadeira escola pastoral: pela geografia, pelo número de pessoas que é reduzido nalgumas comunidades e isso faz com que tenhamos algumas contingências relativas à forma como nos organizamos e esta ideia de comunhão seja um exercício diário muito exigente e que pode comprometer a corresponsabilidade, mas estamos a fazer caminho”, disse.

“A Igreja precisa de reencontrar os traços essenciais que a definem através da Palavra e de gestos e precisa de ver se a forma como estamos corresponde efetivamente aquilo que é a exigência do momento e, para mim, a corresponsabilidade é uma palavra chave e essencial em todo este discernimento”, acrescenta.

“Não há outro caminho em nome da transparência e de melhor conhecer para melhor servir”, acrescentou.

“Há sempre dificuldades mas acredito que mesmo num contexto de grande dispersão como é o nosso podemos viver em comunhão e escutar-nos de forma autêntica como fizemos aqui em Fátima, com tanta diversidade de contextos”, disse ainda.

“O que é certo é que qualquer plano pastoral que venhamos a fazer aqui ou nos Açores precisará sempre de ser gizado em contexto sinodal”, conclui.

Os participantes nas Jornadas Pastorais debateram e aprovaram a proposta de texto conclusivo, no qual se sublinha que “a sinodalidade em Portugal está viva, em processo e em construção”.

As reflexões dos últimos dias foram vistas como “um verdadeiro exercício de sinodalidade”, no qual se assumiu o “autêntico desejo de se aprofundar e alargar os horizontes do caminho sinodal”.

A síntese apontou a “importância da presença comunicacional” da Igreja, com presença “mais ativa” nos debates públicos e também nas plataformas digitais, sobretudo junto dos jovens.

“É fundamental comunicar bem, com clareza e proximidade. sem deixar nenhuma realidade nem pessoa para trás”, aponta o documento.

Os debates assinalaram a necessidade de formação, para padres e leigos, e de orientações comuns para as comunidades católicas, que as possam aplicar “com ritmos e metodologias próprias”.

Os grupos também assinalaram várias dificuldades, como “resistências culturais, falta de tempo e de meios, dificuldades de comunicação e cansaço institucional”.

Os trabalhos, com o tema ‘O processo sinodal nas Dioceses e na Conferência Episcopal Portuguesa’, iniciaram-se com uma reflexão sobre “Teologia e Espiritualidade Sinodal”, por D. Alexandre Palma, bispo auxiliar de Lisboa e diretor interino da Faculdade de Teologia da UCP.

O programa de terça-feira foi dedicado à implementação do processo sinodal nas dioceses e nos serviços nacionais da Igreja em Portugal, cinco meses depois do I Encontro Sinodal, que também se realizou em Fátima.

Os mais de 100 participantes defenderam “maior transparência e prestação de contas”, nomeadamente através da “elaboração de relatórios acessíveis e da criação de canais de comunicação mais eficazes”.

Outra proposta passa pela criação de redes interdiocesanas, “promovendo espaços de cooperação, partilha de boas práticas e construção conjunta de projetos pastorais”.

O secretário da CEP, padre Manuel Barbosa, recordou ainda aos presentes a realização do Jubileu das equipas sinodais e dos órgãos participativos, que vai ter lugar no Vaticano, de 24 a 26 de outubro.

 

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