Portugal: Emigração e desemprego são os «grandes temas sociais»

Jornalista João Santos Duarte analisou realidade migratória nacional dos últimos 50 anos.

O jornalista João Santos Duarte considera que a emigração e o desemprego são atualmente os “grandes temas sociais” em Portugal.

 

O comunicador falou com a Agência ECCLESIA em Tomar, durante um encontro nacional de capelanias e secretariados diocesanos ligados à Pastoral das Migrações, onde apresentou as conclusões de um trabalho intitulado ‘A grande debandada’, publicado pela Renascença.

 

A reportagem centrou-se na comparação entre a realidade da emigração dos anos 60 e a realidade atual, sobretudo “nestes últimos três anos” de “crise económica”.

 

Para João Santos Duarte, a saída de portugueses para o estrangeiro foi sempre um fenómeno “estrutural” do país, “embora com vagas e com fases”.

 

Mesmo entre 1990 e 2000, quando houve “uma sensação de crescimento económico” e Portugal se afirmou como destino de “imigração”, o fluxo migratório para o exterior “nunca parou”.

 

E voltou a crescer nos tempos mais recentes, com a “entrada da troika” e a implementação por parte do Governo de diversas políticas de “austeridade”.

 

De tal forma que a emigração e o desemprego “associado ao empobrecimento das condições de vida”, são atualmente “os grandes temas sociais” em Portugal, realça o jornalista.

 

Em média, saem do país “mais de 120 mil” portugueses “por ano”, o que “equivale muito ao que acontecia nos anos 60”, embora nessa época os números por vezes atingissem patamares “muito superiores”.

 

Outro fator em comum é que boa parte das pessoas continuam a emigrar “porque não têm outra opção, porque não têm trabalho ou tendo trabalho, é muito precário e por isso aspiram a outras condições de vida”.

 

A grande diferença para a época atual está na forma como os emigrantes lusos vão para o estrangeiro e as ferramentas que têm à disposição para se prepararem para o contexto que vão enfrentar.

 

Nos anos 60, recorda João Santos Duarte, “as saídas do país eram muito dificultadas, e as pessoas tinham que emigrar muitas delas clandestinamente, a salto, como se dizia na altura”, atravessando a fronteira com Espanha, rumando sobretudo a França.

 

A viagem era feita “em condições muito precárias e a maioria chegava a França sem saber falar francês, sem qualquer base de apoio, sem ter conhecimento da cultura e da língua”, frisa o repórter.

 

Atualmente, além de Portugal já não viver num regime ditatorial, as fronteiras estão mais abertas, a globalização e os avanços tecnológicos facilitaram as deslocações e o acesso à informação.

 

“No mundo da internet, as pessoas têm muito mais informação à disposição, podem procurar informações sobre os países de acolhimento, documentos necessários, condições de vida, quais são os ordenados, saem muito mais informadas”, aponta João Santos Duarte.

 

Hoje Portugal conta com cerca de 10 milhões de habitantes e tem outros cinco milhões de portugueses espalhados pelos diversos continentes.

D. António Vitalino, membro da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana, sustenta, por outro lado, que falta “mão-de-obra” pastoral para o apoio às comunidades de emigrantes portugueses que crescem no estrangeiro.

 

Em declarações à Agência ECCLESIA, no âmbito do encontro nacional de secretariados diocesanos de Migrações e Capelanias de Imigrantes, que está a decorrer em Tomar, o bispo de Beja realça que “a Igreja Católica tem de acompanhar mais de perto essas pessoas”.

 

“Dado que é uma instituição por natureza missionária, se as pessoas e o povo estão em saída, a Igreja também tem de adotar essa mentalidade”, aponta o prelado, para quem as dioceses nacionais ainda são muito dominadas por uma “mentalidade” centrada na “ocupação de lugares” e “têm dificuldade em deixar que o clero seja mais móvel”.

 

D. António Vitalino defende também a necessidade de apostar numa maior ligação “com as Igrejas dos países de acolhimento”, sobretudo para acompanhar de perto as comunidades migratórias, “nos primeiros tempos”.

 

Em causa, para aqueles que deixam o seu país, está sempre a adaptação a uma realidade diferente: “É o trabalho, a língua, a cultura, a religiosidade popular e nos primeiros tempos precisamos de colaborar uns com os outros”, sustenta o bispo.

 

Numa análise aos desafios atuais do fenómeno migratório, o prelado destaca o facto de a emigração, ao contrário do que aconteceu em Portugal entre as décadas de 50 e 80 do século XX, ser hoje um movimento “transversal em todas as idades, em todas as profissões”.

 

Recorda ainda os emigrantes que atualmente, ao contrário do passado, são cada vez mais “vítimas de intermediários ou angariadores”.

 

Pessoas que, a coberto “desta ou daquela firma”, depois “não satisfazem os seus compromissos com os trabalhadores”.

 

Para todos estes desafios são precisos sacerdotes também preparados para compreenderem e responderem às necessidades das comunidades migrantes.

 

“Às vezes andamos aí nas universidades, nas faculdades, ainda a estudar coisas do antigamente só, precisamos de estudar um pouco a evolução cultural e religiosa que se nota no mundo, o fenómeno da secularização tem que afetar profundamente a maneira da Igreja evangelizar e a mobilidade então ainda muito mais”, conclui.

 

O encontro nacional dos agentes pastorais ligados às Migrações, intitulado “Longe é mais perto do que se imagina”, decorre até sexta-feira em Santa Iria, Tomar, na Diocese de Santarém.

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