Por António Pedro Costa

Em frente à televisão, assisto à procissão das velas do dia 12 de agosto, no recinto sagrado da Cova da Iria. As luzes dançam na noite, como um rio de estrelas que se prolonga até ao horizonte. E, de repente, recuo no tempo.
Foi exatamente há cinquenta e três anos, numa noite igual, que, ainda muito novo, conjuntamente com outros jovens portugueses, representando as diversas regiões do país e também das então colónias, transportei o andor de Nossa Senhora de Fátima. Lembro-me do brilho húmido das velas refletido nos rostos, do murmúrio das orações que subiam ao céu como um incenso invisível, do perfume das flores que envolvia a imagem sagrada.
O peso do andor não era apenas físico, era um peso de devoção, de entrega e de orgulho por estar ali, representando o meu Distrito Insular. Sentia nos ombros a responsabilidade de estar tão perto da Imagem de Nossa Senhora e, ao mesmo tempo, o privilégio imenso de a acompanhar no meio daquela maré humana de fé.
Olhando o mesmo cenário na televisão, sinto o mesmo arrepio na pele. É como se a juventude, os cânticos e as luzes daquela noite regressassem todos de uma vez, acendendo no coração uma chama que nunca se apagou. Que emoção, que saudade e que bênção poder recordar.
Já voltei algumas vezes ao Santuário de Fátima, e cada visita trouxe-me paz, mas nunca senti tanta emoção como nesta noite, nesta recordação viva da minha juventude. É como se aquele momento inicial tivesse marcado o meu olhar para sempre, tornando-se a medida de todas as outras visitas.
Fátima é um lugar onde o coração bate ao ritmo das preces de todos. É um espaço agregador, onde as diferenças se apagam e todos se sentem irmãos na mesma fé. Ali, as distâncias desaparecem e une-se o que está separado, consola-se quem sofre, renova-se a esperança de quem caminha e de quem de joelhos paga a sua promessa.
Ao ver o Santuário iluminado e as velas acesas nas mãos de milhares, compreendo que, em Fátima, ninguém está só. A fé une-nos como se fossemos parte de uma mesma família, onde o silêncio é oração e a luz é promessa. E é esta certeza que levo comigo, a de que há lugares onde o céu parece mais perto, e Fátima é um deles.