Risco de pobreza é mais alto entre quem tem problemas de saúde

Crianças são as mais afectadas pelo aumento da pobreza. Assimetrias entre quem tem maiores e menores rendimentos voltaram a crescer

Uma em cada cinco pessoas que vivem em Portugal é pobre, o que ainda é agravado pela situação de saúde frágil, dizem os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), que nesta sexta-feira publicou números definitivos sobre a pobreza relativos a 2013, relacionando, pela primeira vez, as dificuldades de acesso a cuidados de saúde com as dificuldades económicas.

A pobreza voltou a aumentar em 2013, abrangendo 19,5% da população portuguesa (era de 18,8% em 2012). A taxa é mais alta, de 21,5%, entre as pessoas que referem ter algum tipo de problemas de saúde, o que compara com uma taxa de 16,7% relativa às pessoas que referem não ter limitações.

Do inquérito realizado sobre as condições de vida, o INE concluiu que a existência dessas limitações “no desempenho das actividades habituais revelou-se sobretudo associada à existência de privação material, sendo que 41,2% das pessoas severamente limitadas se encontravam em privação material”.

A falta de dinheiro foi a principal razão apontada para as pessoas não conseguirem satisfazer os cuidados de saúde, caso dos exames e tratamentos médicos (53,5%) ou dentários (82,5%).

Nas situações de maior vulnerabilidade, o INE diz que a falta de dinheiro para pagar os cuidados de saúde “assumiu proporções bastante significativas”. Essa foi a razão referida por 73,6% das pessoas que estão simultaneamente em risco de pobreza e em privação material relativamente a exames ou tratamentos médicos. E no caso das pessoas que não conseguem fazer exames ou tratamentos dentários, a percentagem sobe para 96,4%.

Por outro lado, mais de dois terços da população idosa referiu ter alguma limitação devido a problemas de saúde “no desempenho das actividades que são habituais para as restantes pessoas”.

O mesmo inquérito do INE, publicado na véspera do Dia Internacional da Erradicação da Pobreza, vem confirmar alguns dados já conhecidos em Janeiro sobre a realidade portuguesa. Para medir a pobreza, o conceito estatístico oficial adotado a nível europeu refere-se a “risco de pobreza”. E, neste contexto, o país voltou aos níveis de pobreza de há dez anos; 27,5% das pessoas estão em risco de exclusão social (2,8 milhões de pessoas); a “forte desigualdade na distribuição dos rendimentos” mantém-se; o risco de pobreza é mais elevado entre as mulheres do que entre os homens; e o aumento da pobreza foi transversal a todos os grupos etários, mas as crianças são as mais afetadas. Refira-se que onde o risco de pobreza mais aumentou foi entre as famílias monoparentais com uma ou mais crianças, e nas famílias com crianças e três ou mais adultos.

De resto, a questão da pobreza infantil é um dos assuntos que vai merecer um trabalho “mais profundo”, ao nível da diocese de Angra, na medida em que o Serviço Diocesano da Pastoral Social elegeu-o entre as prioridades para este ano. Conta para o efeito com uma parceria com a Cáritas Diocesana e no próximo ano está prevista mesmo uma conferência para sinalizar o problema, considerado já “como muito grave apesar de muito escondido”.

A um nível global e centrado nas questões da fome, o Papa Francisco aludiu hoje ao “doloroso cenário” da fome e desnutrição que ainda atingem milhões de pessoas em todo o mundo.

“Ainda há muito por fazer no que se refere à segurança alimentar, que se apresenta ainda como uma meta longínqua para muitos”, advertiu, numa mensagem enviada ao diretor-geral da organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), José Graziano da Silva, divulgada pelo Vaticano.

No Dia Mundial da Alimentação, o Papa evoca o 70.º aniversário da FAO e exige que a comunidade internacional dê prioridade a quem sofre com a fome e desnutrição, “sobretudo pela distribuição iníqua dos frutos da terra”.

Francisco sustenta que já não é possível conceber “uma sociedade em que os recursos fiquem nas mãos de poucos e os menos favorecidos se vejam obrigados a apanhar apenas as migalhas”.

A mensagem recorda o objetivo de “libertar a humanidade da fome”, uma meta “inadiável” que não depende apenas de “fenómenos económicos”.

“Cada vez mais, a desigualdade é o resultado da cultura que descarta e exclui muitos dos nossos irmãos e irmãs da vida social”, denunciou.

O Papa realça que “dois terços da população mundial” não tem proteção social, o que afeta em particular os pequenos agricultores, criadores de gado ou pescadores, “obrigados a viver precariamente”.

“Penso nos mais desfavorecidos, nos que, por falta de preocupação social, sofrem as nocivas consequências de uma crise económica persistente ou de fenómenos relacionados com a corrupção e a má governação, para além de sofrer as mudanças climáticas que afetam a sua segurança alimentar”, assinalou.

Nesse sentido, sublinha que é preciso ir para além das ajudas “pontuais” para passar a um “novo modelo de proteção social, tanto no plano internacional como nacional”, deixando de lado “interesses contrários à dignidade humana”.

CR/Lusa/Ecclesia

Scroll to Top