Comissão do Vaticano defende simplificação dos processos para renuncia e afastamento em casos de abusos e deixa recomendações aos bispos portugueses

Relatório anual dedica reflexão central à questão da reparação e compensações

Foto: capa do relatório da Comissão de proteção de Menores do vaticano/Vatican Media

A Comissão Pontifícia para a Proteção dos Menores, do Vaticano, sublinha no seu segundo relatório anual, publicado hoje, a importância de um protocolo simplificado para a renúncia e afastamento de membros da Igreja envolvidos em situações de abusos.

“A Comissão enfatiza a importância de comunicar publicamente os motivos da renúncia e/ou remoção, quando a decisão estiver relacionada com casos de abuso ou negligência”, refere o documento dado a conhecer hoje e citado pela Agência Ecclesia.

O organismo destaca a necessidade de “preservar o devido respeito pelos princípios da privacidade e da presunção de inocência”.

Num relatório com mais de 200 páginas, a CPPM aborda políticas e procedimentos adotados pela Igreja Católica para a proteção de crianças, adolescentes e adultos vulneráveis no ano de 2024.

Este segundo relatório anual apresenta conclusões relativamente ao “estudo detalhado da Comissão sobre reparações e a sua base pastoral-teológica, entendida como a responsabilidade da Igreja de acompanhar as vítimas e sobreviventes na sua jornada de cura e reparação”, com um “vademécum” operacional.

A CPPM pede centros de escuta, sublinhando que a Igreja deve reconhecer os seus erros e pedir perdão, de forma clara e em público, além de oferecer apoio espiritual e psicológico às vítimas.

O apoio financeiro é entendido como um dos múltiplos elementos que integram a reparação, que passa ainda por alterações nas estruturas internas e aplicação de medidas disciplinares, profiláticas e educativas para evitar novos casos, envolvendo toda a comunidade.

“As regras, os costumes e as práticas dos sistemas jurídicos de cada país variam quanto à disponibilidade de compensação financeira para vítimas e sobreviventes que sofreram abuso sexual em contexto católico”, assinala o documento.

“Além da questão das compensações financeiras ordenadas pelos tribunais, permanece a questão de a Igreja fornecer voluntariamente uma compensação financeira para além do pagamento de serviços específicos (cuidados médicos, terapêuticos e psicológicos) às vítimas e sobreviventes.”

O relatório anual aborda o papel do Grupo Focal de Vítimas e Sobreviventes, com representantes das quatro regiões globais, valorizando as suas perspetivas na formulação das políticas de proteção, convidando ainda a “criar uma rede de ensino superior que inclua centros de investigação de universidades católicas especializados em direitos humanos, prevenção de abusos e proteção”.

“Só quando os procedimentos canónicos se encarnam nas realidades locais, quando as políticas se traduzem em vigilância permanente a nível paroquial, em formação nos seminários e nas casas religiosas, é que se pode começar a escrever um caminho de vida”, escreve D. Thibault Verny, presidente do CPPM.

O relatório também cita a expansão da iniciativa ‘Memorare’, programa de capacitação em proteção nos países do sul global, com 20 acordos vigentes e outros 12 em negociação ao redor do mundo, incluindo dioceses lusófonas.

A CPPM foi criada pelo Papa Francisco em 2014 e, desde 2022, integra o organograma da Cúria Romana, ligada ao Dicastério para a Doutrina da Fé.

Novo relatório defende desenvolvimento e implementação de «mecanismo de auditoria robusto» e mandato «forte» para Grupo VITA

O documento, divulgado hoje, recomenda à Conferência Episcopal Portuguesa “o desenvolvimento e a implementação de um mecanismo de auditoria robusto”, que integre vítimas e sobreviventes no desenvolvimento de políticas.

Os responsáveis da CPPM apelam a “uma recolha robusta de dados por parte das comissões diocesanas para promover uma cultura de transparência e a responsabilidade baseada em dados”.

A Comissão recomenda ainda que o Grupo VITA tenha “um mandato forte e claro” da CEP para “promover uma formação robusta em matéria de proteção em todas as dioceses”.

O relatório enfatiza as medidas positivas adotadas em Portugal, como a criação de comissões diocesanas com leigos capacitados, a divulgação acessível dos canais de denúncia, a criação de programas de formação e sensibilização ou o trabalho no “acompanhamento das reparações dos danos causados às vítimas e sobreviventes de abuso sexual”.

Durante o ano de 2022, a CEP pediu um estudo sobre casos de abuso sexual na Igreja em Portugal nos últimos 70 anos a uma Comissão Independente, que validou 512 testemunhos relativos a situações de abuso, que seria apresentado em fevereiro de 2023.

A 22 de maio de 2023, a Conferência Episcopal Portuguesa criou o Grupo VITA para acolher denúncias de abuso, trabalhar na prevenção e acompanhar vítimas e agressores.

A CPPM convida os bispos portugueses a “facilitar o acesso” ao relatório final da Comissão Independente e a esclarecer o modelo de cooperação da CEP com a as conferências de Institutos Religiosos e Institutos Seculares.

O organismo do Vaticano lamenta ainda “a falta de resposta ao seu questionário quinquenal específico de proteção, enviado aos bispos antes da sua visita ad limina”, em 2024.

O relatório defende “clareza” para a avaliação dos trabalhos do Grupo VITA e às garantias da sua sustentabilidade.

A CPPM observa, por outro lado, “uma falta de clareza no que diz respeito a quem é responsável pela sensibilização da Igreja local sobre as diretrizes nacionais de proteção”.

Registe-se que desde janeiro de 2021, a Igreja Católica em Portugal tem novas diretrizes para a “proteção de menores e adultos vulneráveis”, sublinhando uma atitude de vigilância nas várias atividades pastorais e de colaboração com as autoridades.

Os pedidos de ajuda dirigidos ao Grupo VITA podem ser encaminhados para a linha de atendimento telefónico 915 090 000 ou através do formulário para sinalizações disponível no site www.grupovita.pt.

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