Editorial

Quaresma deve ser uma verdadeira caminhada de conversão.

A quaresma tem que doer

A Igreja vai ficar de quarentena a partir de amanhã. O desafio é colocado a cada cristão individualmente e às comunidades de forma organizada em dioceses. Tempo medicinal de cura. Não ritualidade conservada nas páginas dos calendários do quotidiano que se repete mas tempo que traz novidade e abertura ao futuro.

As primeiras comunidades dos discípulos de Jesus reuniam-se regularmente no primeiro dia da semana, depois dos afazeres da jornada de trabalho para celebrarem a sua fé no Senhor ressuscitado. Cada domingo Páscoa. A Páscoa semanal que alimenta a fé, fortalece a esperança e anima a caridade. Celebram desde logo a Páscoa anual, páscoa das páscoas, dia que dura 7 semanas, a mais importante solenidade cristã: se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé, professa o apóstolo Paulo.

Quando a rotina entra nos ossos dos cristãos perde-se a alegria do evangelho. Os primeiros cristãos deram-se conta disso e criaram um tempo preparatório para melhor viverem a Páscoa. Chamaram-lhe quaresma (quarentena de dias), tempo de penitência, de oração, de jejum e de misericórdia.

Jesus de Nazaré também fez quaresma, travessia do deserto que antecedeu o início da vida. E abre o seu ministério com este convite: convertei-vos porque o reino está!

O papa Francisco avisa: se a esmola não dói não vale. É que a bíblia nem sequer fala em dar esmola, mas em fazer justiça, isto é misericórdia, devolver ao pobre o que lhe é devido.

O bispo António propõe à Diocese de Angra uma caminhada de conversão que passa por três primados: Palavra, Graça e Testemunho.

Do primado da palavra nasce a oração: faz-se lendo, meditando e rezando o Evangelho; é a oração a partir da Palavra. A leitura divina da vida pois que nem só de pão se vive e a cada passo há a tentativa de querer fazer dos obstáculos alimento.

Do primado da graça cresce a santidade: faz-se recusando o egoísmo auto-suficiente; é a liberalidade que reconhece a justa autonomia das realidades criadas. A aditividade consome e desumaniza o ser. O sacrifício separa para o pobre o que me foi emprestado pelo autor de todos os bens.

Do primado do testemunho irradia a paz: faz-se partilhando com alegria; é o amor feito serviço. Construir uma sociedade alicerçada não no interesse especulativo mas no bem do outro.

Tempo de cura que dói mas que sana. Tempo que desperta o desejo de saltar para fora de si, de passar bem ao largo do egoísmo e voltar-se para o outro que nos encontra.

O médico trata quem está doente. O remédio cura a doença. Só estar são é que não dói.

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