Ouvidoria de Vila Franca do Campo promove conferência sobre bênçãos de pessoas na Igreja

Foto: Pe. José Júlio Rocha (Arquivo)

Iniciativa tem lugar no Centro Pastoral da Igreja Matriz de Vila Franca do Campo

O Vigário Episcopal para o Clero e Formação irá proferir uma conferência sobre o documento Fiducia Supplicans, divulgado no último mês de dezembro, onde se fixa a possibilidade de bênção dos casais em situação canonicamente irregular ou casais compostos por pessoas do mesmo sexo.

A iniciativa é promovida pela ouvidoria de Vila Franca do Campo e decorre no dia 22, pelas 20h00, no Centro Pastoral da Igreja Matriz de São Miguel Arcanjo.

Com entrada livre, esta conferência irá refletir sobre o conteúdo deste documento do magistério que surge na sequência de dúvidas levantadas por alguns cardeais à cerca da atitude da Igreja diante de pessoas que encontrando-se em situação irregular pede à Igreja uma bênção.

O conferencista, padre José Júlio Rocha, é doutor em Teologia Moral e assistente da Comissão Diocesana Justiça e Paz.

O Dicastério para a Doutrina da Fé (Santa Sé) publicou no dia 18 de dezembro uma declaração, aprovada pelo Papa Francisco, que permite “abençoar casais em situação irregular e casais do mesmo sexo” mas “permanece firme na doutrina da Igreja sobre o casamento”.

Segundo o cardeal Victor Manuel Fernández, o valor da declaração ‘Fiducia supplicans’ é oferecer “uma contribuição específica e inovadora ao significado pastoral das bênçãos”, permitindo ampliar e enriquecer a compreensão clássica das bênçãos, “que está intimamente ligada a uma perspetiva litúrgica”, a reflexão teológica, “baseada na visão pastoral do Papa Francisco”, implica um verdadeiro desenvolvimento a partir do que foi dito sobre as bênçãos no Magistério e nos textos oficiais da Igreja.

“É precisamente neste contexto que se pode compreender a possibilidade de abençoar os casais em situação irregular e os casais do mesmo sexo, sem validar oficialmente o seu estatuto ou alterar de alguma forma o ensinamento perene da Igreja sobre o matrimónio”, acrescenta.

O prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé refere que esta declaração pretende ser também uma “homenagem ao Povo fiel de Deus, que adora o Senhor com tantos gestos de profunda confiança na sua misericórdia” e que, com esta confiança, pede “constantemente a bênção da Mãe Igreja”.

O segundo capítulo do documento, dos parágrafos 7 ao 30, analisa o significado das várias bênçãos, que têm como destino pessoas, objetos de devoção, lugares de vida, e explica, “de um ponto de vista estritamente litúrgico”, que a bênção exige que o que é abençoado “esteja em conformidade com a vontade de Deus expressa nos ensinamentos da Igreja”.

No capítulo seguinte, o terceiro, do parágrafo 31 ao 41, esclarece que, para evitar “qualquer forma de confusão e escândalo”, quando um casal irregular ou do mesmo sexo pede uma bênção, esta “nunca será realizada ao mesmo tempo que os ritos civis de união ou mesmo em conexão com eles, nem mesmo com as roupas, os gestos ou as palavras próprias de um casamento”.

D. Victor Manuel Fernández contextualiza que a declaração ‘Fiducia supplicans’ considera várias questões que chegaram ao dicastério nos últimos anos, e, ao preparar o documento, este organismo da Santa Sé “consultou especialistas, empreendeu um cuidadoso processo de redação” e discutiu o texto no Congresso da Secção Doutrinária do Dicastério, adiantando também que durante esse período, “o documento foi discutido com o Santo Padre”, que também reviu o texto e “o aprovou com a sua assinatura”.

O colaborador do Papa refere ainda que quando estudavam o tema da nova declaração, foi divulgada uma resposta de Francisco “às Dubia de alguns cardeais”, o que também “forneceu esclarecimentos importantes para esta reflexão e representa um elemento decisivo para o trabalho do Dicastério”.

“Cada bispo, na sua diocese é autorizado pela declaração ‘Fiducia supplicans’ a ativar este tipo de bênçãos simples, com todas as recomendações de prudência e de atenção, mas em nenhum modo é autorizado a propor ou a ativar bênçãos que possam assemelhar-se a um rito litúrgico”, precisam.

“A declaração contém a proposta de breves e simples bênçãos pastorais (não litúrgicas, nem ritualizadas) de casais irregulares (não das uniões), sublinhando que se trata de bênçãos sem forma litúrgica, que não aprovam nem justificam a situação em que se encontram essas pessoas”, pode ler-se numa nota posterior em resposta a muitas reações negativas a este documento.

“Alguns bispos, por exemplo, estabeleceram que cada sacerdote deve realizar o discernimento, mas poderá dar essas bênçãos apenas de modo privado. Nada disso é problemático, se é expresso com o devido respeito por um texto assinado e aprovado pelo próprio Sumo Pontífice, buscando de algum modo acolher a reflexão nele contida”, acrescenta o comunicado.

O Vaticano pede, ainda,  que se lute contra a criminalização da homossexualidade, com “formação, defesa da dignidade humana, ensino da Doutrina Social da Igreja e diversas estratégias que não admitem pressa”.

“Os documentos do Dicastério para a Doutrina da Fé, como ‘Fiducia supplicans’, podem requerer, nos seus aspetos práticos, mais ou menos tempo para a sua aplicação, segundo os contextos locais e o discernimento de cada bispo diocesano com a sua diocese. Nalguns lugares não existem dificuldades para uma aplicação imediata, noutros há a necessidade de não inovar nada enquanto se toma todo o tempo necessário para a leitura e a interpretação”, sustenta o Vaticano.

A nota de imprensa pede que seja tida em atenção o “contexto” de algumas declarações dos episcopados, realçando que “em diversos países existem fortes questões culturais e até mesmo legais que requerem tempo e estratégias pastorais, a longo prazo”.

“Se existem legislações que condenam à prisão e, em alguns lugares, à tortura e até à morte, o simples fato de declarar-se homossexual, entende-se que seria imprudente uma bênção. É evidente que os bispos não queiram expor as pessoas homossexuais à violência”, explica o documento distribuído à imprensa.

“Permanece importante, porém, que estas Conferências Episcopais não sustentem uma doutrina diferente daquela da declaração aprovada pelo Papa, enquanto é a doutrina de sempre, mas sobretudo que proponham a necessidade do estudo e do discernimento para agir com prudência pastoral num tal contexto”.

Segundo o Vaticano, a “verdadeira novidade desta declaração” não é a possibilidade de abençoar “casais irregulares”, mas “o convite a distinguir duas formas diferentes de bênção”, ou seja, as “litúrgicas ou ritualizadas” e as “espontâneas ou pastorais”.

“O tema central, que convida particularmente a um aprofundamento que enriqueça a prática pastoral, é a compreensão mais ampla das bênçãos e a proposta de aumentar as bênçãos pastorais, que não exigem as mesmas condições daquelas realizadas num contexto litúrgico ou ritual”, sublinha o comunicado de imprensa.

O Dicastério para a Doutrina da Fé sustenta que está a responder a um pedido do Papa para “pensar um modo de abençoar que não implique tantas condições para realizar este gesto simples de proximidade pastoral”.

“Se se aproximam juntas duas pessoas para pedi-la, simplesmente implora-se, ao Senhor, paz, saúde e outros bens para estas duas pessoas que as pedem. Ao mesmo tempo, implora-se que possam viver o Evangelho de Cristo em plena fidelidade e que o Espírito Santo as livre de tudo que não corresponde à vontade divina e de tudo que requer purificação”, indica a nota.

O Vaticano assume a necessidade de “uma catequese” que ajude aa entender que este tipo de bênção “não é uma ratificação da vida que levam aqueles que a imploram”.

“Teremos de habituar-nos, todos, a aceitar o facto que, se um sacerdote dá este tipo de bênçãos simples, não é um herético, não ratifica nada, não está a negar a doutrina católica”, insiste o dicastério.

Os responsáveis da Doutrina da Fé concluem com votos de que um maior desenvolvimento destes temas possa ajudar os ministros da Igreja Católica a ser “mais livres e talvez mais próximos e fecundos, com um ministério pleno de gestos de paternidade e de proximidade, sem medo de ser mal-interpretados.

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