“Temos de ser paliativos na relação uns com os outros” diz cardeal patriarca de Lisboa

D. Manuel Clemente é o presidente da Festa do Senhor Santo Cristo e numa entrevista exclusiva ao Igreja Açores, programa de rádio e site, fala sobre a religiosidade do povo açoriano, e dos temas que estão na ordem do dia como a eutanásia, a família e os jovens

O cardeal patriarca de Lisboa considera que a fé no Senhor Santo Cristo e a religiosidade do povo açoriano, em geral, “é um grande milagre que aqui acontece” porque os açorianos continuam através destas manifestações a ter presente o exemplo de Jesus.

“É um culto muito forte que toca em muita gente dos Açores e não só, e esta atração pela imagem é muito tocante porque ninguém fica de fora: toca todos os crentes e também os menos crentes” refere o presidente da festa do Senhor Santo Cristo que hoje presidirá à Eucaristia e à procissão solene que percorrerá as principais ruas de Ponta Delgada passando em sete igrejas e conventos da cidade.

“São marcas fortíssimas; é um grande milagre: o grande milagre que aqui acontece, e por isso causa espanto, é a imagem de alguém que viveu há dois mil anos mas que se torna tão viva e tão presente e,  em torno desta imagem, da sua expressão, daquele sofrimento contido, tantas e tantas gerações de homens e mulheres encontram o reflexo da sua vida”, diz D. Manuel Clemente.

Na entrevista exclusiva ao Igreja Açores, o presidente da Conferência Episcopal fala da religiosidade do povo açoriano.

“É muito difícil explicar mas creio que os Açores têm a razão mais certa: nunca foi fácil viver nos Açores, a vida é muito telúrica, e não nos permite uma grande tranquilidade. A vida é muito bela mas frágil e isso leva-nos a colocar questões que obtém a sua resposta na vida de Jesus”, refere lembrando que esta importância da religião nos Açores tem sido um exemplo e um contributo inegável para a vida nacional.

Os açorianos, são gente que “continua a ser uma presença forte no país e na igreja, da cultura e da fé”, refere D. Manuel Clemente.

A propósito dos temas que atualmente dominam a atenção da Igreja como o Sínodo dos Bispos sobre os Jovens e a fé, o bispo de Lisboa destaca a importância da interpelação dos jovens.

“Este sínodo, com esta temática dos jovens, da sua vocação e presença na igreja, traz esta marca: uma esperança muito particular que já atravessa a preparação” frisa, salientando que  há três tempos a ter em conta neste caminho: a preparação que já é muito intensa; os trabalhos e depois a receção das orientações.

“A receção que as igrejas locais fizerem das conclusões deste sínodo é muito importante porque é isso que garante o futuro” diz.

“Os jovens são sempre uma parte muito desafiante da igreja: a voz dos que estão dentro e de outros que não estando fazem ouvir o seu eco, como é próprio desta geração: a história é a de sempre, mas é a deles; há sempre uma explosão de entusiasmo e anseio”.

Sobre a Eutanásia, D. Manuel Clemente apela aos cristãos para se empenharem no esclarecimento da sociedade em defesa da vida e diz que a sociedade tem de ser “mais paliativa”.

“Trata-se da vida humana que deve ser acompanhada por todos nós, da concepção à morte natural” porque “a vida é um todo e exige da sociedade um acompanhamento paliativo”, refere.

“Habitualmente restringimos esta palavra à última fase da vida, mas ela acompanha-nos sempre porque  precisamos de cuidados sempre, mas nós descuidamo-nos muito neste cuidado”, acrescenta.

“As pessoas dispersam-se muito, e temos pouca atenção ao outro” precisa, sublinhando que  “temos de recriar vizinhanças e nesta fase desta vida terrena- a longevidade é um bem- há que existir um maior acompanhamento”.

“A eutanásia não é solução; a solução é sermos paliativos em relação uns aos outros”.

“Temos de estar mais próximos todos;  é um desafio que temos de ganhar como sociedade. É uma responsabilidade de todos, isto é para a sociedade inteira e a vida é o que nos torna gente e não podemos abandonar-nos em qualquer fase da nossa existência”, afirmou ainda.

Nesta entrevista ao Igreja Açores que pode ouvir aqui, o prelado nacional, que por ser cardeal é chamado a colaborar direta e frequentemente com o Papa Francisco, lembra que a defesa da vida, tal como as questões relacionadas com a mudança de sexo ou os casamentos entre pessoas do mesmo sexo, são questões fraturantes e cabe à igreja em particular, e à sociedade em geral, assumirem o compromisso de prevenir fraturas e quando elas existem fazer tudo para juntar as partes.

“ Esse é o grande desafio, é a nossa frente e aí estamos todos ou devemos estar todos”.

“Há uma exigência cultural: antes as coisas estavam garantidas; hoje há a possibilidades de percursos mais individualizados, temos de nos voltar a encontrar não por necessidade de sobrevivência mas como necessidade de uma vida melhor, que só pode ser conjugada”, conclui.

“Passamos de uma sociedade obrigatoriamente solidária para uma sociedade tendencialmente individualizada que tem de voltar a reencontrar-se mais à frente com uma solidariedade reinventada”, disse ainda.

O cardeal patriarca de Lisboa fala nesta entrevista do pontificado de Francisco que “trouxe à vida da igreja, e que é resultado daquele clima da igreja sul americana, uma exigência evangélica redobrada: a proposta cristã da vida” decalcada da vida de Jesus.

“O que espero é este reforço evangélico” refere deixando no final um apelo aos açorianos: “Peço aos meus amigos dos Açores que continuem a ser Portugal no meio do Atlântico que já foi o meio do mundo e que continua a ser o meio de muito mundo seja em que continente for”.

A entrevista na integra pode ser ouvida a partir do meio dia, hora dos Açores, no Rádio Clube de Angra e na Antena 1 Açores.

 

(Com Tatiana Ourique)

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