“Defender a própria identidade sem se abrir à diferença é criar uma sociedade autorreferencial”, afirma D. José Ornelas

 

Foto: Agência ECCLESIA/CB

O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), D. José Ornelas, criticou hoje, na abertura do ‘Fórum Migrações’, em Fátima, a rejeição da abertura à diferença que leva à criação de uma sociedade centrada em si mesma.

“Pretender defender a própria identidade sem se abrir à diferença e à alteridade e à transformação social é criar uma sociedade autorreferencial, para não dizer incestuosa, controladora e manipuladora, incapaz de responder a um mundo em constante movimento que gera encontros diferenciados e parcerias novas para novas realidades”, afirmou D. José Ornelas.

Bispos portugueses, participantes das dioceses com ligação à dinâmica das migrações, aos organismos nacionais da CEP e às congregações religiosas estão hoje reunidos, no Centro Pastoral Paulo VI, com o objetivo de sensibilizar e formar as comunidades cristãs para o fenómeno migratório.

Segundo o bispo de Leiria-Fátima, fazer jus ao ADN identitário de um povo “não é ver o estrangeiro como um perigo e um inimigo, mas como alguém que se acolhe na sua riqueza, na sua necessidade e pobreza e que nessa condição partiu para receber e dar, onde for acolhido”.

“Por isso é importante que o processo legislativo em curso seja uma ocasião de real esforço de direito e de justiça, desde as condições de entrada no país, à sua integração social, à sua defesa contra explorações e exclusões”, indicou.

D. José Ornelas explicou que o ‘Fórum Migrações’ pretende ser uma “tomada de consciência e um passo decidido da Igreja em Portugal para responder a um fenómeno que atinge dramaticamente e, de forma mais ou menos intensa, todos os países, tanto os que se debatem com a emigração dos partem, como os que são metas de migrações humanas”.

“Concretamente, no nosso país, sobretudo nos últimos anos, este fenómeno atingiu dimensões nunca conhecidas anteriormente, impondo-se, por isso, a tomada de medidas para garantir que as pessoas que chegam ao nosso país o façam em segurança e sem interferência de redes de manipulação e extorsão”, salientou.

Segundo o presidente da CEP, esta é a melhor forma de “assegurar uma justa e bem-sucedida integração” dos migrantes, bem como de impedir “a difusão da xenofobia, da deturpação interesseira da verdade, da manipulação do medo em nome de uma ideia e uma identidade fechada que contradiz o ADN” do povo português, “nascido com a migração de povos”.

Reforçando que a Igreja em Portugal não pode ficar alheia ao fenómeno migratório, o bispo de Leiria-Fátima espera que este o ‘Fórum Migrações’ seja o primeiro de muitos encontros, uma vez que os problemas não se vão resolver todos hoje.

“Que se afirme na Igreja, em cada uma das nossas igrejas diocesanas e na Igreja no seu conjunto, uma cultura nova, uma cultura do respeito, uma cultura por dever cumprido, uma cultura de acolhimento que não desconsidera todas as outras componentes”, pediu.

No discurso, o presidente da CEP valorizou o contributo que os migrantes dão às cidades portuguesas, nas quais assumem funções “mais diversificadas”, em serviços públicos e sociais, bem como em indústrias, escolas e universidades.

“Em muitos dos nossos lares e locais de cuidado dos mais frágeis, são os estrangeiros, a maioria dos que cuidam dos mais desvalidos, como o estrangeiro samaritano do Evangelho, o único que se compadeceu daquele que tinha ficado à margem da estrada da vida”, referiu.

Sobre o acolhimento dos migrantes, D. José Ornelas apontou que “não há melhor caminho de integração” do que sentar-se nos bancos de uma igreja, ao lado de pessoas que não se conhecem, cuja língua não se fala, mas que olham e são “olhados como irmãos e irmãs”.

“Nós igreja temos um papel que é de integração, mas é preciso que funcione, e que o façamos funcionar, e que tenhamos iniciativa para que, não esperando simplesmente que venham bater à nossa porta, mas sermos nós a tomar a iniciativa de integrá-los, de chamá-los”, referiu.

Realçando que a Igreja não quer fazer do acolhimento proselitismo, o presidente da CEP incentivou os presentes que sejam “verdadeiros samaritanos para quem chega” ao território nacional.

Organizado pela Conferência Episcopal Portuguesa, o ‘Fórum Migrações’ incluiu, durante a manhã, um momento de sensibilização inicial feito pelos organismos nacionais que desenvolvem a sua ação na área das migrações e trabalhos de grupo de escuta e diálogo.

A tarde conta com a presença de Rui Marques, antigo Alto-Comissário para a Imigração e membro do Consenso Imigração, e Pedro Góis, diretor científico do Observatório das Migrações, que vão procurar ajudar os presentes a pensar sobre a legislação e a ação da sociedade em geral sobre este tema.

O encerramento do encontro cabe ao presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana, D. José Traquina.

(Com Ecclesia)

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