Autonomia: dois clérigos distinguidos no dia dos Açores

Insígnias Autonómicas serão entregues a 38 personalidades e instituições

A Sessão Solene do Dia dos Açores, que se realiza esta segunda-feira em Vila Franca do Campo, ilha de São Miguel, numa organização conjunta da Assembleia Legislativa e do Governo dos Açores, ficará assinalada pela imposição de 38 Insígnias Honoríficas.

Da lista de agraciados deste ano constam 26 personalidades, 6 das quais a título póstumo, e 12 instituições. Entre elas estão dois clérigos da igreja açoriana: o bispo emérito de Angra e o chefe do protocolo do Vaticano Monsenhor José Bettencourt. Ambos serão condecorados com a Insignia Autonómica de Valor que de destina a agraciar “o desempenho, excecionalmente relevante, de cargos nos órgãos de governo próprio ou ao serviço da Região” ou “feitos cívicos de grande relevo”.

Dom António de Sousa Braga liderou a diocese durante quase 20 anos, sendo o 38º bispo de Angra e o segundo natural dos Açores, deixando como legado a proximidade entre a igreja e o povo de Deus.

“Um homem do povo”, “próximo”, “humilde”, “atento e atencioso”; a “melhor porta aberta da igreja nos Açores”, são algumas das  expressões manifestadas espontaneamente ao Sítio Igreja Açores por padres e leigos no dia em que assinalou o 19º aniversário de episcopado.

Chegou à região com 55 anos, altura em que foi ordenado Bispo, depois de ter estado em Roma e em Lisboa.

O bispo açoriano é natural de Santa Maria, estudou desde os 13 anos fora da região, primeiro no Funchal, depois em Coimbra e finalmente em Roma, onde foi ordenado sacerdote em 1970 pelo Beato Paulo VI. Só regressou aos Açores, para residir permanentemente no arquipélago há 20 anos, quando foi ordenado Bispo.

Entre notas pastorais e mensagens, há uma ideia que passa sempre em todas elas e especialmente dirigida ao seu clero: o ministério sacerdotal deve ser encarado como  um “instrumento de misericórdia divina” e uma forma de levar ao mundo a “proximidade” de Deus. E, por isso, “não basta fazer coisas pelas pessoas”; “há que ir ao seu encontro, pôr-se no seu lugar; fazer como Jesus que revelou o Pai misericordioso através das suas palavras e dos seus gestos”.

Convidou todos os padres a assumirem “dinamismo missionário”, de “chegar a todos sem exceção”, com atenção especial aos que estão mais à margem da sociedade, privilegiando a “preparação” do seu trabalho pastoral, em vez das tarefas administrativas. Pediu-lhes, ainda,  que fossem “ousados e criativos” no cumprimento da sua missão, sem contudo caírem em “exibicionismos”, nem na tentação “de serem funcionários do sagrado”.

Para o futuro deixou uma mensagem de otimismo: o importante, dizia o então responsável pela Igreja Católica nos Açores é que “não nos desencorajemos de prosseguir este trabalho que desde o inicio sabíamos que era difícil e possivelmente doloroso, em certa medida, até para a própria igreja diocesana”.

A “isto se chama passar de uma igreja clerical para uma igreja ministerial, com mais leigos e, sobretudo, com mais leigos bem formados”.

Ainda antes da resignação viu cumprido um dos seus desejos: receber a imagem da Virgem Peregrina na sua ilha natal: “Nossa Senhora é a verdadeira porta da misericórdia e é ela que com o seu filho nos conduzem a Deus”.

A visita da Virgem Peregrina havia de o conduzir a uma das homilias mais felizes da reta final do seu episcopado: “a igreja para ser esposa e mãe tem de aprender com as mulheres” e tem “de inventar um novo ministério que lhes dê o protagonismo a que elas têm direito não para substituírem os homens ou serem ordenadas” mas para “ensinar a igreja a ser aquilo que deve ser: a verdadeira esposa de Cristo”.

Foi a última grande celebração a que presidiu na diocese como Bispo titular.

Monsenhor José  Avelino Bettencourt é o primeiro cónego honorário da Sé de Angra. Açoriano de nascimento, Monsenhor José Bettencourt chegou à Curia romana  há 15 anos, ainda na era de João Paulo II. Mas foi Bento XVI quem o chamou para chefe do protocolo, um lugar próximo do Papa, onde se preparam audiências, se recebem as altas individualidades e acertam agendas.

A proximidade do Sumo Pontífice é física, pois a Secretaria de Estado fica no mesmo andar e no corredor em frente aos aposentos papais no Palácio Apostólico da Cidade Estado do Vaticano.

Natural das Velas de São Jorge, de onde partiu para Otawa no Canadá, com apenas 3 anos de idade, fez a sua primeira romaria em São Miguel, integrando o rancho de São Braz, em 1995.

Este sacerdote nascido no coração do arquipélago, doutor em Direito Canónico, com formação inicial em filosofia, história e geografia, tem dedicado praticamente toda a sua vida ao serviço da igreja, integrando o corpo diplomático da Santa Sé, depois de frequentar entre 97 e 99 a Pontifícia Academia Eclesiástica, onde concluiu a formação para o serviço diplomático.

Nesse mesmo ano é nomeado para a Nunciatura Apostólica na Republica Democrática do Congo (Kinshasa) e três anos mais tarde regressa a Roma para integrar a Secção das Relações com os Estados na Secretaria de Estado do Vaticano onde acompanha os assuntos para os países de língua inglesa, francesa e portuguesa da África Ocidental. Neste período, integra várias delegações oficiais. Em 2007 é nomeado para a Prefeitura da Casa Pontifícia para o serviço do protocolo na “antecâmara” Pontifícia. Em 2012 o Papa Bento XVI nomeia-o Chefe de Protocolo da Secretaria de Estado e, no âmbito da celebração da Inauguração do Pontificado do Papa Francisco (2013) acolhe 140 Delegações Oficiais de Estados com relações com a Santa Sé.

Dos Açores guarda “boas vivências”, mais do que memórias. “Vou lá pelo menos de dois em dois anos pois a minha familia mantém casa nas Velas”, na ilha de São Jorge, dizia em Dezembro de 2014 ao Sítio Igreja Açores.

“Encontrar no meio de uma rocha um ponto e procurar a natureza verde, o azul … não há nada mais bonito que os açores, onde conciliamos o sossego, a beleza, a cultura e recuperamos as nossas raízes”, pontuadas por esta ou por aquela lembrança, seja na Caldeira do Santo Cristo, seja em Ponta Delgada ou na Montanha do Pico, que “gosto de contemplar para recarregar baterias”, sublinhava.

“A força da natureza da nossa terra ajuda-nos a relativizar as coisas”, sublinha, como quem sabe que em cada momento e em cada tempo somos sempre nós e as nossas circunstâncias.

Monsenhor José Bettencourt foi distinguido com a Comenda da Ordem Militar de Cristo pelo Presidente Cavaco Silva; é Comendador da Ordem de Cavalaria do Santo Sepulcro de Jerusalém e recebeu a Grã Cruz de Capelão Conventual “ad honorem” da Ordem Soberana Militar de Malta.

A Região vai, ainda, condecorar o ex primeiro ministro dos XIII e XIV Governos Constitucionais, António Guterres, e o antigo Embaixador de Portugal em Washington, Nuno Brito.

O Dia da Região Autónoma dos Açores foi instituído pela Assembleia Legislativa em 1980.

Observada em todo o arquipélago como feriado regional, a data celebra a “afirmação da identidade dos Açorianos, da sua filosofia de vida e da sua unidade regional”, consideradas “base e justificação da autonomia política que lhes foi reconhecida e que orgulhosamente exercitam”.

As Insígnias Açorianas, cujo regime jurídico foi aprovado em 2002, visam distinguir “os cidadãos e as pessoas coletivas que se notabilizarem por méritos pessoais ou institucionais, atos, feitos cívicos ou por serviços prestados à Região”.

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