“Crise repercutiu-se com muita seriedade na vida das famílias”, diz presidente da Conferência Episcopal

O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) alertou hoje em Fátima para o impacto social e económico da pandemia nas populações mais desprotegidas do país e nas instituições de solidariedade.

“Esta crise repercutiu-se com muita seriedade na vida das famílias e das pessoas que vivem com maior dificuldade”, disse D. José Ornelas aos jornalistas, na conferência de imprensa de apresentação da peregrinação internacional aniversária de outubro, a que preside entre hoje e amanhã.

O bispo de Setúbal destacou que as paróquias, onde a crise também tem um impacto “sério”, são um “barómetro social”, que ajuda a perceber o que vai acontecendo no país.

Segundo o responsável católico, os serviços destinados às pessoas carenciadas têm registado uma “subida exponencial” de pedidos de ajuda, nos primeiros meses de 2020.

“Aí se vê o drama que acontece à volta e dentro de cada paróquia, de cada instituição”, precisou.

O presidente da CEP apelou a uma atenção particular aos “imigrantes recentes”, que se encontraram “sem nada, de repente”, com situações “realmente dramáticas”.

D. José Ornelas assumiu que, do ponto de vista económico, a pandemia provocou um “problema sério” para a Igreja Católica, sobretudo nas instituições com maior número de trabalhadores, onde há mais peso dos ordenados.

As dificuldades estendem-se à “manutenção da vida da Igreja”, tendo o bispo sadino apresentado um exemplo de paróquias da Diocese de Setúbal: “A retribuição que o padre costuma receber teve de ser reforçada, a nível central, para que não faltasse o essencial”.

“Isto constitui um problema relevante e prático na vida da Igreja”, insistiu.

D. António Marto, bispo de Leiria-Fátima, referiu por sua vez que uma das sugestões apresentadas pela CEP passa por “reunir os vigários-gerais” de todas as dioceses, sobre esta matéria, para se traçar uma “radiografia” da situação económica, face à “quebra das receitas”.

O cardeal apontou o caso particular da Cáritas, que está a sofrer um “impacto forte”, dada a suspensão do seu peditório público anual,

“Tem aumentando o número de pessoas e famílias que batem à porta da Cáritas, sobretudo para as necessidades mais básicas”, alimentação, luz, água, relatou.

Já o reitor do Santuário, padre Carlos Cabecinhas, realçou que a falta de peregrinos afeta “toda a vida da cidade de Fátima e suas imediações”.

“Temos procurado estar atentos às situações de carência que têm emergido”, indicou, aumentando em 60% os apoios a pessoas e famílias, bem como a IPSS, num total de 800 mil euros.

D. José Ornelas assinalou ainda que o período de confinamento gerou “esquemas diferentes”, desejando que as pessoas recuperem “o gosto e a necessidade de se encontrarem”.

“Isto não é uma questão para a Igreja, simplesmente”, observou.

Na sua intervenção, D. António Marto destacou que não basta olhar só para uma “Igreja de números”.

O cardeal António Marto afirmou  que a pandemia de covid-19 pode contribuir para a erosão do “cristianismo cultural”, mas também pode representar uma oportunidade para a Igreja.
O também bispo de Leiria-Fátima considerou hoje que a pandemia pode ter posto a descoberto o processo “de secularização ou erosão do chamado cristianismo cultural”, que “já vinha de trás”, num momento em que as igrejas só podem estar ocupadas por um terço dos seus fiéis.
“Poderemos dizer que, talvez, a pandemia acelerou este processo como em tantos outros aspetos, como na política, na economia ou na finança, [expondo] fragilidades que já se vinham manifestando e que agora se agravaram e se aceleraram”, notou o cardeal, que falava numa conferência de imprensa no Santuário de Fátima.
No entanto, António Marto considerou que a pandemia também pode representar “uma oportunidade” e um “grande desafio que se abre” para a Igreja.
“Não sabemos quando e como é que isto vai terminar. Isto pode não deixar de interrogar muita gente sobre o sentido da sua vida, sobre a fragilidade da condição humana e pode abrir muitos corações à fé ou à dimensão religiosa”, notou.
Neste contexto de pandemia, poderão surgir “acontecimentos surpreendentes – Deus também é sempre surpresa” -, que venham “dar um novo vigor à fé cristã”, referiu.
“Não olhemos para uma Igreja apenas de números, mas para uma Igreja chamada a fortalecer a sua fé, a personaliza a fé e a vivê-la num novo contexto, a tornar-se muito mais evangélica, a ir às fontes da fé”, salientou.
O cardeal recordou as palavras do Papa Francisco – “desta crise ninguém sai igual” -, para salientar que “uma crise é também sempre uma oportunidade”, acreditando que a Igreja possa sair fortalecida num contexto pós-pandemia.

O cardeal comentou a encíclica ‘Fratelli Tutti’, sobre a fraternidade e a amizade social, publicada no dia 4 de outubro, referindo que a mesma “condensa o pensamento social do Papa Francisco”, com uma “nova narrativa” para a Doutrina Social da Igreja.

“A encíclica propõe a ‘alternativa Francisco’, perante um mundo desumanizado, fragmentado, dividido, cujas patologias foram postas a nu e agravadas pela pandemia”, observou.

D. António Marto deixou votos de que o distanciamento social não se torne “distanciamento da solidariedade, da humanização, do contacto”.

(Com Ecclesia)

Scroll to Top