Desleixos e fraudes não são dos mortos

Por Renato Moura

A notícia caiu como uma bomba: a Segurança Social fez pagamentos de pensões, no valor de cerca de 3,7 milhões de euros, a beneficiários já mortos. Trata-se de uma descoberta verdadeira, pois que resulta de uma auditoria do Tribunal de Contas (TC). Há dezenas de situações em que as pensões indevidas foram pagas durante mais de 10 anos!

Apurou o TC que em mais de metade do valor não detectou procedimentos tendo em vista recuperar os pagamentos indevidos! E nos casos em que houve registo da dívida só se terá recuperado cerca de um terço do que não se deveria ter pago!

Fica assim demonstrado que o Estado, que se gostaria de ter como pessoa de bem, não garante fiabilidade nos seus procedimentos. Será por não ter dotado a Segurança Social de um sistema informático capaz? Ou por não haver interconexão com as bases de dados dependentes dos Ministérios da Justiça e das Finanças? Ou por incapacidade e/ou incúria dos responsáveis e funcionários do Instituto de Segurança Social ou do Centro Nacional de Pensões? Ou por fraude: de dirigentes ou funcionários públicos; ou de outras pessoas que se abotoaram com pensões que lhes não pertenciam?

Pasme-se, nem no interior da Segurança Social o sistema funciona, tendo a auditoria apurado que mesmo perante a morte do pensionista e da cessação da sua pensão própria, se continuou a pagar-lhe pensão de sobrevivência!

Preocupante é que as situações detectadas se referem apenas a uma amostra; é caso recear: se a montra é assim, o que não estará dentro da loja?

Está claro que o sistema está completamente aberto ao risco de fraude. Não se pode esperar que seja a probidade dos familiares do morto a constituir a segurança do sistema! Como é possível que não se tenha montado um sistema que exija a prova de vida periodicamente? Será possível acreditar que as fraudes foram sempre e só de familiares ou pessoas relacionadas com o falecido, que assinaram documentos ou movimentaram valores indevidamente ao longo de anos e anos?!

Gravíssimo é o Estado se mostrar incapaz de recuperar o que foi pago indevidamente. Não basta admitir os erros e acusar o sistema. As fraudes são esquemas de gente concreta e corrupta; e as culpas não podem morrer solteiras.

Na era da informática, com a nossa vida espiolhada em tantas bases de dados, como entender uma tamanha inoperância e degradação da administração pública? E como não protestar veementemente contra a delapidação do erário público?

Paga-se a mortos. Demora-se escandalosamente para fixar pensões aos vivos. Falta honradez e justiça.

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