Humberto Moniz deixa de “iluminar” o Santo Cristo 70 anos depois

“Mentor” da iluminação do Santuário cede lugar ao filho

Todos os anos, na sexta-feira, apoderava-se de Humberto Moniz, que se considera um “servidor do Senhor”, uma grande ansiedade fundada no receio que algo falhasse na inauguração da iluminação das festas do Santo Cristo, em Ponta Delgado, Açores.

Após 70 anos “a servir o Senhor”, o responsável pela iluminação das maiores festividades religiosas dos Açores, que se realizam no fim-de-semana, considerou, aos 82 anos, que estava na hora de “passar o testemunho a uma nova geração”, que seja capaz de trazer uma “nova criatividade” ao projeto ao qual começou por se ligar com apenas 12 anos.

A iluminação do Santo Cristo, no Santuário da Esperança e zonas periféricas, constitui uma das principais atrações das festas, que mobilizam em Ponta Delgada, na ilha de São Miguel, emigrantes oriundos dos Estados Unidos da América, Canadá e Bermudas, a par de residentes de outras ilhas açorianas e do continente, além de turistas acidentais.

Humberto Moniz orgulha-se de ter sido apresentado ao papa João Paulo II quando esteve em Ponta Delgada, em 1991, e de criar, em sua homenagem, o suporte de luz para a igreja do Santo Cristo da insígnia papal, que foi montado no lado sul do torreão, contendo cerca de oito mil lâmpadas.

A inauguração da iluminação correu sempre bem, mas falhou uma vez devido a um raio que atingiu um posto de abastecimento de energia junto ao Forte de São Brás, a poucos centenas de metros do palco das festividades do Santo Cristo.

A iluminação arrancou, contudo, uma hora mais tarde, uma vez resposta a normalidade no fornecimento de energia, mas não deixou de ser responsabilizado pelos populares pelo fracasso, apesar da rutura não ter tido lugar na estrutura que havia sido montada, idêntica aos anos anteriores, mas sim num posto de abastecimento da energia pública.

Sempre preocupado em renovar a decoração e as cerca de 160 mil lâmpadas (média dos últimos anos), foi Humberto Moniz que introduziu o formato atual da iluminação, com a sua equipa que tirava férias para se mobilizar no projeto, tendo em 1950 sido utilizadas 7.600 lâmpadas e empregues 26 operários, números que foram crescendo ao longo das décadas.

Em 2000 foram usadas 135 mil lâmpadas e empregues 92 operários, entre os quais se contam eletricistas, homens afetos às arrecadações e aos andaimes, carpinteiros, pintores e pedreiros.

Vários destes operários são desempregados que nesta altura do ano têm a possibilidade de auferir um vencimento durante as cerca de cinco semanas de montagem do cenário da iluminação das festividades, que contempla a fachada da igreja do Santo Cristo, Campo de São Francisco, artérias na periferia e principais ruas de Ponta Delgada.

Humberto Moniz, que é o responsável pela conceção artística da estrutura de iluminação, passando depois o conceito ao desenhista, afirma que as lâmpadas são pintadas todas à mão, em diversas cores, com recurso a verniz.

Ao longo de todos os anos em que assumiu estas responsabilidades, Humberto Moniz desenvolveu uma “relação de proximidade” com o Santo Cristo, sendo um homem de “muita fé” no ‘ecce homo’.

Refere que foi sempre “muito bem recebido” pelas freiras e reitores do Santuário da Esperança, para onde desenvolveu muitos trabalhos, a título gratuito, e onde se encontra a imagem do Santo Cristo.

Se tivesse a possibilidade de voltar atrás, seria apenas para iluminar as festividades “talvez ainda melhor”.

Considerando-se uma pessoa exigente, porque acredita que esta é a via para a qualidade do serviço prestado, Humberto Moniz teve a oportunidade de promover projetos de iluminação em Madrid e Lisboa, entre outras cidades, a par de várias ilhas dos Açores.

Lançou dois livros, um sobre os momentos mais marcantes da sua vida e outro específico sobre as festas onde regista momentos marcantes “ao serviço do Santo Cristo”.

 

(Com Lusa)

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