“A nossa pastoral tem de ser um despertador da família”

Assembleia Extraordinária do Sínodo sobre a família arranca na abertura do ano pastoral da Diocese de Angra. Este domingo, dira 28, faz-se uma oração mundial pela família

A uma semana da abertura da primeira assembleia extraordinária do Sínodo sobre a família, o responsável diocesano, Pe José Medeiros Constância, apresenta as expetativas para esta reunião e as linhas de orientação para o próximo ano pastoral em termos da pastoral da família

 

Sítio Informativo Igreja Açores- Que expetativas tem em relação à assembleia extraordinária do Sínodo da Família que começa no dia 5 de outubro?

Pe José Medeiros Constância- As expetativas são muito boas no sentido de que a Igreja se vai debruçar sobre um dos seus problemas fundamentais que é a família e percebè-la à luz do Evangelho. Estou muito esperançado, como julgo que a maioria das pessoas também estará, nas respostas aos problemas cocnretos e reais que hoje se colocam às familias. Acredito que vão ser efetivamente debatidos e, do Sínodo, poderão sair sair respostas pastorais concretas que nos permitam ajudar as famílias a reencontrarem-se no verdadeiro sentido. Por isso, as expetativas não poderiam ser melhores.

Sítio Informativo Igreja Açores- O instrumento de trabalho do Sínodo mostra que há várias realidades familiares pelo mundo e que as respostas têm de ser, necessariamente, diferentes. Algumas até sobre problemas fraturantes…

Pe José Medeiros Constância– Sem dúvida que os problemas são diferentes, mas o que há a reter é esta disponibilidade da igreja para olhar de frente para os problemas, mesmo que sejam fraturantes e isso tem que ser sublinhado. A igreja disponibilizou-se para ouvir. E, nesta primeira assembleia, haverá essencialmente debate e só no próximo ano deverão surgir orientações concretas, embora genéricas e que atenderão às questões abordadas no inquérito. Por exemplo, o Papa já perguntava o que é que cada igreja particular fazia em determinadas situações. Isto significa que, na pastoral familiar ordinária, já há uma pastoral de família, para a família e com a família e na pastoral geral há uma enorme predisposição para o acolhimento e para a integração de algumas situações que tenham por base questões fraturantes.

Sítio Informativo Igreja Açores- Para além dessa capacidade de ouvir espera-se que a igreja dê respostas concretas. Acolher mas integrar, por exemplo…

Pe José Medeiros Constância- Desconheço a orientação dos trabalhos. Primeiro o Sínodo vai falar para dentro da Igreja e só depois para fora. Creio que haverá uma orientação que sublinhará a beleza do que é ser e fazer família. Essa vai ser a principal função do Sínodo, julgo eu.

Sítio Informativo Igreja AçoresNinguém está a dizer que a igreja tem de abandonar a ideia que tem de família. A questão é se está disponível para aceitar outras formas de família?

Pe José Medeiros Constância- Mas era isso que eu estava a dizer. Em 2015, julgo que existirão orientações claras relativamente a algumas questões, por exemplo, a situação dos divorciados recasados. Acho que ninguém pode esperar que a igreja seja pelo divórcio- nunca o será- mas há cristãos que, separando-se civilmente casam-se de novo civilmente. A igreja tem que ter uma resposta para estas pessoas. Por conseguinte, julgo que a igreja tem de considerar esta união como um sinal do amor de cristo, uma vivência cristã…

Sítio Informativo Igreja Açores- A igreja deve reconhecer essa situação com uma bênção?

Pe José Medeiros Constância- Sim, bênção ou outra qualquer resposta mas o que deve é olhar para esta situação como uma situação nova onde há amor e isso é um sinal da presença de Cristo. O que não pode acontecer è a exclusão e, julgo, que isso nunca aconteceu. Nós nunca fechámos a porta a ninguém. Creio que os divorciados recasados vão ser aqueles que vão obter uma resposta mais clara deste sínodo.

 Sítio Informativo Igreja Açores Depois de uma organização territorial como vai desenvolver a ação pastoral no próximo ano ao nível diocesano?

Pe José Medeiros Constância– Há dois movimentos: as famílias que estão na paróquia, nas ouvidorias, na ilha e depois na Diocese e este é o movimento mais importante porque tem origem na família. Dá a voz às famílias e pergunta-lhes o que é que elas querem. Este é o maior desafio. Não tenho dúvidas de que a maioria das famílias açorianas é católica e, isso, manifesta-se numa caminhada marcada pela celebração de alguns sacramentos.O problema é que, depois, não há ação fora da família. Ou seja, não há um trabalho fora de casa, enquanto igreja para além da chamada igreja doméstica.

Outra vertente do nosso trabalho é no sentido inverso, ou seja, da diocese para a base. E, neste capítulo, quando damos orientações já estamos a ter em conta aquilo que são as pretensões concretas da família. Por isso, é que a organização territorial é tão importante: arranjar um casal de ligação em cada paróquia, em cada ouvidoria. Daí que eu tenha chamado as duas formas de organização de “Açores +165” e “Açores +16”.

 Sítio Informativo Igreja Açores– Qual é a matriz principal do plano de ação?

Pe José Medeiros Constãncia- É, sobretudo, ir ao encontro daquilo que é a vontade da família. Hoje os problemas das famílias açorianas não são muito diferentes dos problemas das famílias noutras partes do país. Algumas estão a lutar pela sua sobrevivência material e aí a intervenção é ao nível da satisfação das necessidades básicas. E, desse ponto de vista, podemos dizer-lhes a partir do Evangelho, que ele cria caminho para a promoção humana. E por isso, a mensagem é de que não se resignem e que lutem por melhores condições; nós cá estamos para lutar ao seu lado.

Outras, certamente, gritarão que a família está cheia de conflitos geracionais. Alguns deles agravados com o regresso a casa dos filhos casados, pela degradação das suas condições materiais. Não é só um conflito entre pais e filhos em crescimento; é , também, um problema de pais e filhos que têm de reaprender a viver juntos. Este é um problema muito candente: várias gerações a viverem debaixo do mesmo teto.

Finalmente há um problema de vivência religiosa. Nós temos um fundo religioso grande com uma dimensão cristã acentuada mas sem uma vivência plena do Evangelho…

 

Sítio Informativo Igreja Açores- Isso também se promove através da catequese familiar. E a diocese, a este nível, tem trabalhado pouco…

Pe José Medeiros Constância- O problema pode ser colocado de outra forma: quem é que ativa esta catequese familiar? Têm de ser as famílias….

Sítio Informativo Igreja Açores- Então estamos numa equação que não tem solução, pois a familia tendo tantos problemas certamente não vai enveredar por este caminho?…

Pe José Medeiros Constância- Tem que haver uma maior insistência e, sobretudo, uma maior articulação entre os vários serviços diocesanos que trabalham esta problemática da família.

 

Sítio Informativo Igreja Açores- Mas isso não deveria ter sido feito já?

Pe José Medeiros Constância– E está a ser feito. Há muitas familias que destinam parte do seu tempo a ir ao encontro de outras familias; temos grupos de reflexão, movimentos e essa é uma resposta concreta. Depois a catequese está organizada de forma a satisfazer aquilo que a família quer em termos catequêticos. As familias querem que as crianças tenham catequese; a paróquia fornece esse serviço. As familias querem que os seus filhos sejam batizados, façam o percuso catequètico até ao sacramento do crisma, depois sejam casados. Esta organização a Igreja, enquanto estrutura, já providencia através das paróquias. A outro nível mais formativo, da família no seu cojunto, bom… se calhar temos de melhorar qualquer coisa.

 

Sítio Informativo Igreja Açores- Então está tudo bem… as familias querem um “serviço” que a paróquia dá. Assim nunca mais envolvemos as familias verdadeiramente para que elas sejam solução para os seus próprios problemas, sobretudo ao nivel da vivência da fé.

Pe José Medeiros Constância- Não diria isso, mas sim temos duas realidades distintas: precisamos que a família se comporte como igreja doméstica mas ao mesmo tempo nós satisfazemos, através da nossa estrutura, uma resposta cabal aquelas que são as necessidades da família. Não é fácil…

Sítio Informativo Igreja Açores- Mas tem de haver uma resposta inovadora para abrir um novo caminho…

Pe José Medeiros Constância- Colocando as coisas nesses termos eu diria que há um problema de fundo em toda esta problemática: como se formam os cristãos hoje. Se começarmos por dar resposta a essa pergunta se calhar estaremos a trilhar um caminho novo.

A igreja diz que a iniciação cristã se faz durante 10 anos de catequese. Este itinerário é que precisa de ser pensado de forma a que durante o caminho se cresça na fé e se sinta sempre essa necessidade de crescer. Senão nunca passamos da infância em termos de fé. Esse é que é o grande problema dos nossos dias. Temos cristãos que não pensam nem agem como cristãos, nem sequer na prática dominical.

Sítio Informativo Igreja Açores- Como responsável diocesano da pastoral da familia o que é que o seu serviço vai fazer para se aproximar mais deste caminho de mudança e de amadurecimento da fé?

Pe José Medeiros Constância– Só há uma saída para a mobilização das nossas familias: levá-las a um compromisso mais sério com a comunidade de forma que sejam elas a definirem o que querem. Isso vai levar tempo. Se nó olharmos para a familia hoje facilmente identificamos alguns problemas. A familia está transformada numa espécie de refeitório, num lugar de passagem, onde se vê alguma televisão, se joga computador, se trocam umas mensagens, mas e o diálogo, a reflexão, a partilha efetiva, onde andam?…

Sítio Informativo Igreja Açores- A família vive à image e semelhança dos seus membros: alguma apatia…

Pe José Medeiros COnstância- Sim…Por isso é que a nossa pastoral tem de ser uma espécie de despertador da familia, levando-a a sentir necessidade do Evangelho de forma a que perceba a experiência de Jesus Cristo e a viva e ponha em prática. Este é o desafio que o Sínodo nos coloca e para o qual estamos todos convocados. As pessoas não se tornam mais cristãs por causa das inciiativas da igreja. Se não for uma opção pessoal,de cada membro de forma a contribuir para o todo, não avançaremos.

Sítio Informativo Igreja Açores- O que é que será necessário fazer para que, daqui a um ano, o balanço da atividade do serviço diocesano da pastoral da família seja positivo?

Pe José Medeiros Constância– Gostaria que tivessemos 165 casais responsáveis em cada paróquia de forma a que a nossa diocese seja uma fraternidade de familias. A pastoral familiar é muito territorial por isso a organização será fundamental . É nisso que eu aposto, porque a pastoral da família só será bem sucedida se for delineada pelas familias e não imposta por terceiros.

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