O tricinquentenário do Boletim Eclesiástico dos Açores

Pelo cónego Hélder Fonseca Mendes

O Boletim Eclesiástico dos Açores (BEA) está a comemorar 150 anos de edição. É notável para qualquer órgão de comunicação social atravessar os anos de 1872 a 2022, sem qualquer interrupção.

Foi seu fundador o 28º. Bispo de Angra, D. João Maria Pereira de Amaral e Pimentel (1872-1889), que ao entrar na diocese açoriana escrevia no número inaugural: «Tendo assumido o governo desta vasta e importante Diocese e convindo que estejamos em fácil e pronta comunicação com o Reverendo Clero para que a nossa voz se faça ouvir com regularidade e possível prontidão até às últimas extremidades das diferentes Ilhas e sendo o melhor meio de conseguir este fim uma publicação periódica pela qual possamos transmitir diretamente a todos os Muito Reverendos Párocos as nossas ordens, avisos, conselhos, assim como as notícias eclesiásticas e religiosas de interesse público, daremos as providencias necessárias para que todos os meses na ocasião da passagem por esta ilha Terceira do Vapor que toca nas principiais ilhas do Arquipélago esteja publicado um periódico que se intitulará Boletim do Governo Eclesiástico da Diocese dos Açores, no qual serão transcritas as nossas Pastorais, Circulares, Editais, Ordens, avisos ou mandatos que tiverem relação com o Governo da Diocese». Estava assim apresentado aquele que haveria de ser o primeiro e único órgão oficial da Diocese  de Angra.

Mais tarde, o 30º.  Bispo, D. Francisco de Vieira e Brito (1892-1901) ordenou que o BEA fosse dividido em três secções: oficial, instrutiva e noticiosa.

Muito importantes foram os Vigários Capitulares Cónego Dr. José dos Reis Ficher e Monsenhor António Maria Ferreira, este dando um estilo mais ascético ao Boletim e aquele um estilo mais jurídico, em tempos difíceis da primeira República, sem esquecer o último Vigário Capitular Dr. José Bernardo de Almada que nas suas aulas de Direito Canónico no Seminário de Angra citava o BEA por nele se encontrar a legislação diocesana relacionada com cada cânon ou que o aplicava à realidade açoriana.  A este diretor se deve a introdução dos relatórios das conferências eclesiásticas no BEA, bem como a solução de casos práticos apresentados nas mesmas conferências.

Com o aparecimento da revista de âmbito nacional Lúmen em 1937 como «revista de cultura para o clero», que até hoje se publica como órgão oficial da Conferência Episcopal Portuguesa, o Bispo da época, D. Guilherme Augusto da Cunha Guimarães (1928-1957), solidário com os bispos de Portugal, entendeu que já não se justificava um boletim diocesano, pois este havia de espelhar-se na nova revista portuguesa.

Por nada, não termina nesse ano o BEA.  Deve-se ao diretor da época, P. Dr. José Vieira Alvernaz, então reitor do Seminário  de Angra, a quem tradicionalmente estava afeta da direção do Boletim, que ao final desse ano escreve: «Mui acertadamente resolveram os excelentíssimos Prelados Portugueses publicar uma só revista que fosse órgão oficial de toda a Igreja Portuguesa; verifica-se porém, que embora satisfaça os principais fins do Boletim não se podem encher as suas páginas com causas de interesse meramente local que a viriam tornar volumosa sem utilidade para a maioria dos leitores. Fomos autorizados pois pelo nosso Exmo. Prelado a continuar a publicação do Boletim, que deixa de ser órgão oficial da Diocese para se tornar arquivo da vida religiosa da Diocese. Nele daremos notícias dos fatos mais importantes da vida religiosa açoriana, movimento do Seminário e da Ação Católica, de modo que mais tarde seja fácil reconstruir historicamente o passado sem ter de recorrer a fontes tantas vezes difíceis de consultar».

Foi uma maneira de, sem contrariar o episcopado português que decidiu ter um único órgão oficial, continuar a publicar o BEA, sendo hoje pacífica e diferenciada a publicação de ambos os órgãos, de âmbito nacional e diocesano. Este é um exemplo que revela que nestes 150 anos o BEA manteve-se, ora por interesse de alguns dos bispos diocesanos, ora dos seus diretores que não deixaram que desaparecesse. Tal como hoje, o BEA mantem a oportunidade da sua publicação sem prejuízo do novo meio de comunicação digital da diocese, o sítio Igreja Açores.

Na década dos anos 90 do século passado, sendo bispo diocesano D. António de Sousa Braga (1996-2016), releva-se o trabalho do Padre Prof. Doutor Octávio de Medeiros com a publicação de três volumes sobre o BEA: «A Igreja nos Açores – Último Quartel do Século XIX – Índices do BEA 1872-1900, com edição da Santa Casa da Misericórdia da Povoação, Vila da Povoação, 1996 com um prefácio do Professor Avelino Freitas de Meneses, com uma longa introdução de 124 páginas;   A Igreja nos Açores – Primeiro Quartel do Século XX – Índices do BEA 1900-1924, com edição da Santa Casa da Misericórdia da Povoação, Vila da Povoação, 1997 com um prefácio do Professor Artur Teodoro de Matos, com uma extensa introdução de 246 páginas;   A Igreja nos Açores – Segundo  Quartel do Século XX – Índices do BEA 1924 – 1952 , com edição da Santa Casa da Misericórdia da Povoação, Vila da Povoação, 1998 com um prefácio do Doutor José Guilherme Reis Leite, com uma abundante introdução de 230 páginas.  É um trabalho admirável que, a pretexto dos índices, resultou num importantíssimo estudo. Falta algum investigador fazer semelhante obra relativamente aos últimos 70 anos (1952-2022).

Já no século XX, com a atual direção, o BEA foi enriquecido com a publicação de suplementos temáticos a saber: Estatutos, Regulamentos, Normas e Diretivas para a Diocese de Angra (2009), Igrejas Paroquiais dos Açores (2010), Espírito Santo: das Censuras ao Império – o magistério revisitado (2011), A Diocese de Angra na História dos seus Prelados (1695-1812), com introdução e notas da Professora Susana Goulart Costa (2012). Falta fazer o encontro entre os anos 1812 e a criação do BEA  (1872), o que acreditamos que brevemente aconteça. Seguiu-se depois a publicação do Relatório da Diocese de Angra por ocasião da visita ad sacra limina de D. Francisco José Ribeiro Vieira e Brito, 30º. Bispo de Angra (1892-1901), com estudo prévio dos doutores João Maria Mendes e Susana Goulart Costa (2013). Foi ainda publicado um suplemento intitulado Seminário Episcopal de Angra – 150 anos de formação, com a recolha das conferências promovidas ao longo do ano jubilar (2014); A Diocese de Angra no Arquivo Secreto do Vaticano (1691-1919) (2015); Notas Históricas sobre os Bispos Açorianos (1500-2000) de Valdemar Mota; Estatutos, Regulamentos, Normas e Diretivas para a Diocese de Angra – edição revista e atualizada (2017). Ficou suspensa a edição de outros suplementos devido a dificuldades financeiras que a Diocese manifestou.

Finalmente uma palavra e um registo aos diretores que ao longo de um século e meio persistiram em dar à estampa o BEA: D. João Maria Pimentel (1872-1885), D. Francisco do Prado Lacerda (1886-1891), D. Francisco Vieira e Brito (1892-1901), D. José Manuel de Carvalho (1902-1904), D. José Cardoso Monteiro (1905-1906). Até esta data foram diretores do BEA os próprios bispos diocesanos, sendo eles também reitores do Seminário de

Angra. A partir de 1907, foram diretores os reitores do Seminário ou outros professores a saber:  Dr. Albano Maciel (1907-1908), Cónego António Moreira d’Araújo (1909-1910), P. José Patrício Lopes (1910-1911), Cónego José Alves da Silva (1912-1914), Cónego Dr. José Bernardo de Almada (1915-1921), Dr. Manuel Cardoso do Couto (1922-1927), Dr. Manuel de Medeiros Guerreiro (1928-1936), Dr. José Vieira Alvernaz (1937-1941), Dr. Manuel Moreira Candelária (1942-1953), Dr. José de Oliveira Lopes (1943-1960), Cónego Dr. Artur Pacheco Custódio (1961-1965), Mons. Dr. José Soares Nunes (1966-1971),  Cónego Jeremias da Rocha Simões (1972-1979); Cónego Dr. António da Luz Silva (1980-1983), P. Duarte Medeiros Moniz (1984-1985), Cónego Dr. José Piques Garcia (1985-1995), Cónego Dr. Gregório Couto Rocha (1996-2004), Cónego Doutor João Maria Mendes (2005-2008) e Cónego Doutor Hélder Fonseca Mendes (2008-2022).

A caminho dos cinco séculos da criação da Diocese de Angra deixamos garantida a história dos últimos 150 anos, o que ajudará os investigadores a construir a História da Igreja Local nos Açores. O BEA saúda a imprensa regional e demais órgãos de comunicação social, desejando uma longa e próspera vida como a deste órgão diocesano de informação. Obrigado aos leitores e assinantes.

(Texto atualizado no dia 21 de março às 19h36)

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