“Sofri de paroquite” e “dediquei-me muitos às questões sociais”, afirma padre Silvino Amaral

O sacerdote povoacense cumpriu 64 anos de ordenação, uma vida dedicada à promoção social, cultural e cristã da Ribeira Quente

O facto de ter paroquiado toda a vida na Ribeira Quente- “Fui ordenado e colocado nesta freguesia pelo bispo; ninguém queria vir para esta fajãzinha”- o padre Silvino Amaral é porventura um dos sacerdotes açorianos mais conhecidos dentro e fora dos Açores, pela sua ligação à Acção Católica, ao escutismo mas também à Liga Eucarística. Foi inclusivé agraciado com a Ordem de Mérito em 1998 pelo presidente Jorge Sampaio, mas citando o Livro do Eclesiastes “isso é vaidade; fiz o que tinha de ser feito, o resto é vaidade”.

“Criei o primeiro agrupamento do CNE misto na ilha de São Miguel e na Liga Eucarística também participavam, todos os meses, homens e mulheres. Fui eu que meti as mulheres ao barulho e tanto que é preciso metê-las ainda ao barulho na Igreja” refere com satisfação ciente de que o pioneirismo mais do que glória serve para ilustrar a “abertura” do povo “dócil e sempre disponível para a mudança” que lhe foi confiado em 1958.

“Os pescadores, aqui e em todo o lado, são muito abertos” e “foi isso que encontrei aqui: um povo simples e pobre mas muito dócil” refere numa entrevista que vai para o ar no programa de rádio Igreja Açores este domingo, depois do meio-dia no Rádio Clube de Angra e na Antena 1 Açores.

O padre Silvino Amaral cumpriu no passado dia 15 de junho o 64º aniversário de ordenação sacerdotal.

“Quando me ordenei tinha os sonhos da juventude: queria começar a trabalhar; estava voltado para a pastoral e gostava de dar largas à minha vocação e foi o que fiz e acho que fiz o melhor que pude. Procurei integrar-me numa comunidade que estava socialmente abandonada, que  precisava de promoção”.

“Tive que me agarrar à pastoral de base, criei grupos locais que animassem a pastoral. Ia muitas vezes às reuniões da Junta de Freguesia para reivindicar muitas necessidades que sentia que o povo tinha” refere.

Criou o Centro social e paroquial, o agrupamento 260 do CNE, promoveu os grupos bíblicos, mas reconhece: “ Deixei de ser animador pastoral para ser o homem do centro social”.

“Sou do tempo em que tudo vinha de Lisboa e para vir uma decisão que defendesse um povoado como a Ribeira Quente era muito difícil; senti necessidade de fazer coisas… mais do que ser só padre. A pastoral era para reforçar as pessoas, e grupos bem formados para fazerem a manutenção da vida espiritual”.

Foi também o homem que esteve no apoio fundamental à comunidade depois da derrocada, em 1997.

“Nessa altura houve um travão na pastoral e eu quase que me senti obrigado a parar, a deixar de fazer coisas porque caíu tudo em cima do padre. Havia muito dinheiro e as pessoas queriam muito usá-lo” lamenta.

“Foi um dos momentos mais difíceis do meu sacerdócio” avança ainda como que a deixar um conselho aos novos padres.

“Hoje precisam de ser muito inovadores e criativos” já que as pessoas “têm tudo”.

“Antes a Igreja era tudo:  não havia telemóveis, nem televisões, poucos rádios e o padre era o líder local; hoje os padres vão encontrar uma juventude herdeira de telemóveis e televisões, muito fechada em bolhas. Gente menos social e sobretudo voltada para o egoísmo. Todos têm o seu conforto, a sua sala. Quando aqui cheguei a sala do povo era a rua e os jovens eram produto da rua;  hoje já não há rua” afirma.

“Quando cheguei vi que as crianças estavam na rua e que era preciso fazer qualquer coisa para elas saírem da rua. Dirigi-me a uma assistente social para que pudéssemos trabalhar nesse sentido: ela respondeu que as crianças da rua eram as que tinham mais defesas e mais sentido de proteção e humanidade; calei-me pensei no assunto e pude confirmar que assim é. Hoje os padres já não encontram isto”.

A entrevista ao padre Silvino Amaral pode ser ouvida na íntegra este domingo depois do meio dia no Rádio Clube de Angra e na Antena 1 Açores, ou aqui no sítio Igreja Açores.

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