O homem é sempre maior que o seu erro

Por Carmo Rodeia

“A dignidade da pessoa não se perde, mesmo depois de ter cometido crimes gravíssimos”, diz a nova redacção do Catecismo da Igreja Católica, revisto na semana passada pelo Papa Francisco, que declarou tolerância zero à pena de morte.

“A Igreja ensina, à luz do Evangelho, que a pena de morte é inadmissível, porque atenta contra a inviolabilidade e dignidade da pessoa, e empenha-se com determinação a favor da sua abolição em todo o mundo”, pode ler-se, agora, no n.º 2267 do Catecismo.

Durante séculos, a Igreja Católica permitiu e tolerou o recurso à pena capital, “após um processo regular”, como “uma resposta adequada à gravidade de alguns delitos e um meio aceitável, ainda que extremo, para a tutela do bem comum”, sublinha a agência Ecclesia, embora a posição do Vaticano tenha começado a mudar com o Papa João Paulo II, falecido em 2005.

A edição de 1992 do Catecismo, feita já sob orientação de João Paulo II, aceitava a execução de alguém considerado culpado pela justiça  se fosse a “a única forma possível de defender vidas humanas contra um agressor injusto”. Mas estipulava que, sendo suficientes meios não letais para assegurar os mesmos fins, as autoridades deviam ficar por aí, pois “são mais conformes à dignidade da pessoa”.

Em 1997, o mesmo Papa introduziu novidades a partir da encíclica Evangelium Vitae (O Evangelho da Vida, sobre a dignidade e a sacralidade de todas as vidas) em que dizia que os casos em que a execução de um condenado é uma necessidade absoluta “são muito raros, se não praticamente não existentes”.

Mas, agora, o Papa Francisco opõe-se totalmente à pena de morte.

“Hoje vai-se tornando cada vez mais viva a consciência de que a dignidade da pessoa não se perde, mesmo depois de ter cometido crimes gravíssimos. Além disso, difundiu-se uma nova compreensão do sentido das sanções penais por parte do Estado”, diz a nova redação do Catecismo oficial da Igreja Católica, seguido por 1200 milhões de pessoas em todo o mundo.

Já em 2015, em pleno Congresso norte-americano, Francisco tinha mostrado a sua posição firme, lembrando que todas as vidas são sagradas e a sociedade só pode beneficiar com a reabilitação dos que são condenados.

A pena de morte é, em si própria, contrária ao Evangelho, porque é uma decisão voluntária que visa suprimir a vida humana, sem lhe dar a possibilidade real de conversão.

Em Portugal a pena de morte foi abolida a 1 de julho de 1867, uma data que fica registada como aquela em que Portugal voltou a indicar ao mundo o caminho da defesa dos direitos humanos, o que por si deve ser um motivo de enorme orgulho para todos os Portugueses.

A abolição da pena de morte é expressão máxima da tolerância numa sociedade e uma enorme demonstração de confiança no próximo e no sistema de justiça. É , no fundo, acreditar que todo e qualquer cidadão poderá corrigir-se e ser reintegrado na comunidade, independentemente dos crimes que possa ter cometido.

Por isso, a abolição da pena de morte, é a oficialização da cultura do perdão. O homem é sempre maior que o seu erro.

Queira Deus que, em breve, seja  possível a definitiva erradicação da pena capital na China, na Coreia do Norte, nos Estados Unidos da América e em todos os outros países onde, lamentavelmente, ainda vigora.

Scroll to Top