O Mundo precisa de encontrar regras de convivência mínimas, diz professor da Universidade de Brown

Segundo dia das Jornadas de Teologia abordou as questões da ética moderna, e do divino na poesia de Vitorino Nemésio

Tinha um texto escrito sobre “Literatura açoriana- algumas questões éticas”, dando seguimento à intervenção do primeiro dia das II Jornadas de Teologia, no Seminário de Angra,  mas Onésimo Teotónio de Almeida, professor catedrático da Brown University, em East Providence, nos EUA, optou por improvisar sobre os grandes temas da ética moderna, que é como quem diz  uma adequação entre o dizer e o fazer, dentro de  um quadro de valores comum,  de forma “a conseguirmos viver todos sem nos matarmos uns aos outros”.

A partir de uma concepção aristotélica, o próximo presidente da Comissão Organizadora das Comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, explicou a importância da ética e sublinhou o “enorme e seriíssimo trabalho de pessoas que andam à procura de normas e valores que deveriam servir de farol para os homens de hoje , que têm milhões de crenças, para que se respeitem uns aos outros e não se matem”.

“Este é o trabalho da ética moderna e há um conjunto de valores que anda à volta disso: aceitamos a ciência, a tecnologia, a igualdade, a justiça… quando um destes valores é tomado em absoluto dá desastre; quando se acha,  por exemplo que a liberdade individual se sobrepõe a tudo temos episódios como os do Texas” precisou o docente que lembrou a necessidade de hoje se harmonizarem valores. Para isso, “há que saber ouvir, escutar e arranjar soluções de forma serena” de forma a que “num quadro global os direitos individuais sejam respeitados”.

Onésimo Teotónio de Almeida, ex aluno do Seminário de Angra, na década de 70, destacou a importância de uma adequação entre “o que se pensa, o que se diz e o que se faz”.

“Não é coisa só dos políticos é também das famílias: as crianças aprendem não com aquilo que os pais dizem mas com o que os pais fazem”, frisou depois de uma intervenção onde explicitou o valor etimológico da palavra ética, da estética,  e do Evangelho.

Antes já tinha usado da palavra um colega seu de Seminário, o professor e poeta Urbano Bettencourt que apresentou uma conferência sobre “Vitorino Nemésio – o peixe eterno e a alma encardida”.

O docente começou por mostrar a influência de Antero de Quental na poética de Vitorino Nemésio e, particularmente, como a rejeição de uma religião social, no quadro da igreja católica,  marcou a sua relação com o divino.

Para Urbano Bettencourt esta relação nasce e desenvolve-se quando o poeta e escritor terceirense procura fazer a síntese entre as “sobras do passado e daquilo que sobreviveu à lama do presente” e constrói “um reduto literário pessoal e é nesse espaço-tempo que trará para a sua escrita as memórias coletivas e pessoais, o universo intimo dos afetos e desafetos familiares, as cumplicidades amorosas, o lastro da convivialidade social para com esses materiais viver a relação com o Divino”.

“É no interior destes materiais que podemos verificar uma relação familiar com Deus e com o divino numa série de formulações diversas, umas mais inquietas outras mais claras, mas sempre atestando o debate interior marcado pela angústia e pela necessidade de conhecimento” refere Urbano Bettencourt. E deu como exemplo um dos seus últimos poemas- Natal das ilhas- “um poema crepuscular que revela uma aproximação ao fim no qual expressa um conjunto de encargos  para todos os que ficam, num contexto de perda e de desolação, em que a última estrofe introduz um sentido de perda” sobre a qual resta apenas “ uma reminiscência da infância”.

“É neste momento, em que constata a distância entre aquilo que é o seu anseio e a pobreza final do seu trabalho” que a “ aproximação poética a Deus desembocará no drama íntimo de um eu poético, dividido entre a inocência e o pecado, a que ele chama a alma encardida, isto é, passado e presente e a angústia de quem sente ter traído um desígnio que já não é apenas poético mas religioso também”.

Hoje será o terceiro e último dia das jornadas. Rosa Goulart, professora jubilada da Universidade dos Açores, apresentará uma conferência sobre “Vergílio Ferreira: o Deus que (lhe) morreu” e o padre José Júlio Rocha, prefeito de estudos e docente do Seminário de Angra, falará sobre “Fé e Literatura: três ensaios sobre a esperança”.

As Jornadas de Teologia “Deus na Pena dos Homens- Diálogo entre Teologia e Literatura” são uma organização conjunta entre o Seminário Episcopal de Angra e a Academia São Tomás de Aquino.

(Com André Furtado e Tatiana Ourique)

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