Presidente da Cáritas pede nova abordagem para enfrentar a pobreza

A pandemia “isolou” mais as pessoas e fê-las “perder” algum sentido de solidariedade, afirmou a presidente da Cáritas ao programa Igreja Açores que vai para o ar este domingo na Antena 1 Açores e no Rádio Clube de Angra, depois do meio dia. Este domingo a Igreja celebra o V Dia Mundial dos Pobres, inspirado no Evangelho de Marcos “Sempre tereis pobres entre vós” e Anabela Borba lamenta o facto de já não estarmos tão solidários como antes.

“Não sei se este confinamento não exacerbou algum egoísmo em todos nós; não estamos tão solidários como já fomos” refere a presidente da Cáritas Açores reconhecendo que “isolamo-nos mais e embora tenhamos sentido a pandemia de forma diferente da do resto do país e da Europa, na verdade há sectores que sofreram muito, sobretudo a industria do turismo”.

A dirigente lembra que apesar das dificuldades , a Cáritas “não tem sentido uma enorme pressão, não têm sido muitos os apoios dados a vitimas de desemprego por causa da pandemia e isso deve-se a uma atenção maior dos poderes públicos nomeadamente

“É certo que nos Açores há muita pobreza envergonhada mas há um grande apoio público. Os dois governos tiveram muita atenção a estes casos e por isso muitos não chegaram á Cáritas. Termos tido cerca de uma dúzia de novos casos, sinalizados pelas paróquias”, avança destacando a iniciativa da Cáritas Terceira que no ano em curso desenvolveu um projecto de apoio aos taxistas de Angra, um dos grupos com dificuldades expressas.

A presidente da Cáritas lembra que o grande desafio continua a ser a aposta na formação. Mas, para isso, é preciso haver voluntários “despertos  para as questões do desenvolvimento e promoção humana e que se disponibilizem a trabalhar”.

“Temos uma estrutura de Cáritas muito precária nesse sentido; ainda estamos muito focados em questões assistencialistas e as nossas redes Cáritas não têm técnicos nem voluntários preparados para fomentar projectos e procurar financiamentos” refere destacando o trabalho que a Cáritas da ilha Terceira tem promovido neste âmbito.

Neste Dia Mundial dos Pobres arranca também a campanha 10 milhões de estrelas, um gesto pela paz. Na região só quatro ilhas aderiram á campanha: Terceira, Pico, Flores e Corvo.

“O objectivo é trabalharmos as questões da solidariedade e da paz este ano com dinâmicas diferentes”, avançou. Na Terceira, por exemplo, os técnicos vão trabalhar com crianças do segundo ciclo da Escola Ferreira Drumond, procurando falar sobre paz e sobre guerra, não apenas no sentido bélico e promover a campanha “Alimento para todos”.

A entrevista de Anabela Borba pode ser ouvida na integra aqui no sítio Igreja Açores a partir do meio dia, neste domingo, em que o Papa alerta para as consequências sociais e económicas da pandemia, pedindo uma nova abordagem na luta contra a pobreza, na sua mensagem para o V Dia Mundial dos Pobres, que a Igreja Católica celebra este domingo.

“A pandemia continua a bater à porta de milhões de pessoas e, mesmo quando não traz consigo o sofrimento e a morte, é portadora de pobreza. Os pobres têm aumentado desmesuradamente e o mesmo, infelizmente, continuará a verificar-se ainda nos próximos meses”, escreve Francisco.

O texto tem como tema ‘Sempre tereis pobres entre vós’, inspirado numa passagem do Evangelho segundo São Marcos (Mc 14, 7).

O Papa aborda a multiplicação de novas formas de pobreza, questionando discursos políticos que fazem dos pobres “responsáveis pela sua condição” e mesmo um “peso intolerável” para o sistema económico.

Um estilo de vida individualista é cúmplice na geração da pobreza e, muitas vezes, descarrega sobre os pobres toda a responsabilidade da sua condição. Mas a pobreza não é fruto do destino; é consequência do egoísmo”.

Francisco aponta o dedo a agentes económicos e financeiros “sem escrúpulos”, sem “sentido humanitário e responsabilidade social”.

“Um mercado que ignora ou discrimina os princípios éticos cria condições desumanas que se abatem sobre pessoas que já vivem em condições precárias”, acrescenta.

A situação global, indica, foi agravada pela crise da Covid-19, que exige, segundo o Papa respostas concretas para o desemprego, com mais solidariedade social e promoção humana.

A mensagem deixa alertas para o interior da Igreja Católica, destacando que os pobres não são pessoas “externas” à comunidade, mas “irmãos e irmãs cujo sofrimento se partilha, para abrandar o seu mal e a marginalização, a fim de lhes ser devolvida a dignidade perdida e garantida a necessária inclusão social”.

“Aliás sabe-se que um gesto de beneficência pressupõe um benfeitor e um beneficiado, enquanto a partilha gera fraternidade. A esmola é ocasional, ao passo que a partilha é duradoura. A primeira corre o risco de gratificar quem a dá e humilhar quem a recebe, enquanto a segunda reforça a solidariedade e cria as premissas necessárias para se alcançar a justiça”, aponta.

Não se trata de serenar a nossa consciência dando qualquer esmola, mas antes de contrariar a cultura da indiferença e da injustiça com que se olha os pobres”.

A mensagem questiona o tipo de resposta que tem sido dada a milhões de pobres, muitas vezes deixados na “indiferença, quando não a aversão”, defendendo um maior protagonismo dos que são desfavorecidos na criação de novas políticas de solidariedade e a partilha.

“Impõe-se uma abordagem diferente da pobreza. É um desafio que os governos e as instituições mundiais precisam de perfilhar, com um modelo social clarividente, capaz de enfrentar as novas formas de pobreza que invadem o mundo e marcarão de maneira decisiva as próximas décadas”, sustenta o pontífice.

Francisco insiste na ideia de evitar a culpabilização das pobres pela sua condição, considerando que este discurso coloca em causa “o próprio conceito de democracia”.

“Servir eficazmente os pobres incita à ação e permite encontrar as formas mais adequadas para levantar e promover esta parte da humanidade, demasiadas vezes anónima e sem voz, mas que em si mesma traz impresso o rosto do Salvador que pede ajuda”, refere.

 

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