Uma economia que não tenha as pessoas no centro não serve, afirmam palestrantes da jornada sobre Economia e Sociedade promovida pelo Instituto Católico de Cultura

Iniciativa juntou esta noite em Ponta Delgada o economista Bagão Félix e a socióloga Piedade Lalanda

O grande desafio que se coloca às sociedades modernas, em geral, e à açoriana em particular, é fazer com que as pessoas estejam no centro da economia e que esta promova a dignidade humana, o que não está acontecer.

O alerta foi deixado esta noite, em Ponta Delgada pelo economista Bagão Félix e pela socióloga Piedade Lalanda na jornada “Desafios sócio Económicos de hoje”, uma iniciativa promovida pelo Instituto Católico de Cultura, com o apoio do Santuário do Senhor Santo Cristo dos Milagres e da paróquia de São Sebastião, de Ponta Delgada.

“A economia tem uma medida moral que é aferida pela forma como trata os últimos, os que são excluídos e estão no fim da linha” afirmou Bagão Félix ao destacar que hoje “ a economia é pobre porque não promove a dignidade da pessoa humana”.

“A principal pobreza é a das oportunidades de que hoje tantos sofrem, sejam jovens ou menos jovens” afirmou o economista, acrescentando: “ antes pobres eram o que estavam abaixo de um determinado patamar de rendimentos, mas hoje a pobreza é menos mensurável e mais qualitativa”.

“Infelizmente, hoje ser velho deixou de ser uma dignidade; por cada dia que passa 30 pessoas com mais de 65 anos passam a viver sozinhas, isto é a concentração máxima da pobreza que é aquela que junta a escassez de bens materiais ao abandono, ao isolamento”, denuncia ainda o professor de economia, ex. ministro da Segurança Social.

Bagão Félix destacou a importância dos valores da Doutrina Social da Igreja- centralidade da dignidade da pessoa humana; restrições à propriedade privada quando está em causa a preservação do bem comum ou o principio da subsidiariedade- para exemplificar a base de uma “economia com ética e com valores” e falou das virtudes do estado social.

Na sessão, muito participada e moderada pela professora catedrática Maria do Céu Patrão Neves, membro da direção do Instituto Católico de Cultura, Piedade Lalanda procurou, por seu lado, centrar a sua análise nas questões regionais, apresentando os números mais significativos da realidade social açoriana de forma a que “tenhamos consciência para agir”.

A socióloga, que é diretora do Serviço Diocesano da Pastoral Social, sublinhou que o progresso nem sempre significa desenvolvimento.

“Há muitos indicadores da economia que nos dão sinais positivos da sociedade açoriana, mas os indicadores económicos não são suficientes para falarmos em desenvolvimento” afirmou ao lembrar que são “muitos os sinais de alerta” que existem nos Açores situando-os ao nível do emprego, da saúde, da educação e do rendimento.

A socióloga lembrou que a diferença da esperança média de vida, que está 3 anos abaixo da média nacional; a maior percentagem de violência doméstica por cada mil habitantes ou a maior taxa de risco de pobreza do país que se cifra nos 31,8%, fazem dos Açores uma região “desigual”.

“E contudo, quando abrimos o site do Serviço Regional de Estatística e procuramos a palavra pobreza nada aparece. É muito triste! Enquanto não conhecermos a realidade social, não conseguimos agir”, concluiu.

Por isso, acrescentou “o grande desafio é olhar não apenas para a riqueza e pobreza mas para as questões relacionadas com a distribuição de riqueza e as questões da coesão social, dois indicadores claramente desfavoráveis” com a Região a bater recordes nos níveis de privação material, que atinge 13,1% das pessoas, ou o número de beneficiários do Rendimento Social de Inserção, que abrange 9% da população açoriana.

“Os ricos nos Açores têm sete vezes mais do que os pobres. Continuamos a ser uma região desigual”, concluiu ao desafiar os empresários católicos na região a “fazerem a diferença”

“Os empresários católicos açorianos não podem ser iguais aos outros; o desenvolvimento faz-se de felicidade e a desigualdade deve-nos incomodar e desinstalar, reforçando os laços de solidariedade”.

Esta é a II jornada formativa promovida pelo Instituto Católico de Cultura desde que foi reativado, há três anos, “na alegria de refletir e de nos pormos em ação”, afirmou Monsenhor José Constância, presidente do Instituto que já no ano passado desafiou leigos e sacerdotes a refletirem sobre o que é ser Cristão nos dias de hoje.

Esta sexta-feira, Bagão Félix volta a ser orador numa conferência na Igreja Matriz de Ponta Delgada, numa iniciativa que decorre no âmbito da Festa do padroeiro São Sebastião.

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