“Assembleia da República rompeu o dique da vida”, afirma o Grupo de Trabalho Inter-Religioso Religiões-Saúde

O Grupo de Trabalho Inter-Religioso Religiões-Saúde (GTIR) afirmou em comunicado enviado à Agência Eeclesia que a Assembleia da República criou uma “cultura de descarte” e “rompeu o dique da vida”

“A Assembleia da República, com a insistente obsessão pela eutanásia, rompeu o dique da vida”, afirmam nove confissões religiosas que, em maio de 2018, assinaram a Declaração conjunta “Cuidar até ao fim com compaixão”.

Fazem parte do Grupo de Trabalho Inter-Religioso Religiões-Saúde é formado pela Aliança Evangélica Portuguesa, Comunidade Hindu Portuguesa, Comunidade Islâmica de Lisboa, Comunidade Israelita de Lisboa, Igreja Católica, Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (Mórmons), Igreja Ortodoxa da Sérvia, União Budista Portuguesa e União Portuguesa dos Adventistas do Sétimo Dia.

Para o GTIR, “o exemplo do Canadá, da Bélgica ou dos Países Baixos, revela que os lóbis da morte, e novas maiorias circunstanciais, depressa fizeram deslizar a legislação da eutanásia para a oferecer a novas situações de grande vulnerabilidade física, psíquica, social e económica”.

“A assembleia da República insiste com a eutanásia, mas não parece ter refletido sobre a rampa deslizante de outros países”.

Para as nove confissões religiosas, “com a aprovação do suicídio assistido e da eutanásia, a Assembleia da República parece oferecer a morte aos doentes em sofrimento severo e fim de vida como porta de saída, criando, ao mesmo tempo, as condições para uma cultura de descarte dos mais frágeis”.

“O século passado, século das grandes guerras e de grandes dificuldades ao nível médico e de cuidados, respondeu ao sofrimento com a invenção dos cuidados paliativos; o século XXI, século do bem-estar, da qualidade de vida, da medicina de excelência e de grandes recursos ao nível dos cuidados e da farmacologia, oferece a morte”, lembra o documento.

As confissões religiosas reafirmam “a convicção comum de que a vida humana é inviolável e indisponível”, de acordo com a Constituição, por ser “um dom de Deus e “porque é humana e, por isso, é digna”

“Estamos convictos que o futuro e a modernidade não estão na oferta da morte a pedido, mas na construção de sociedades compassivas e capazes de não empurrar ninguém para fora do barco da vida, mas de acompanhar até ao fim, minorando o seu sofrimento. E os Cuidados Paliativos fazem parte dessa aposta”.

As confissões religiosas lembram que o princípio “não matarás” é “património ético da humanidade e fio condutor da civilização”.

“’Matar’ não pode ser um direito e muito menos o pode ser o ‘dever de matar’, porque só a vida é fonte de direito”, lembra o documento.

A vice-presidente da Associação de Juristas Católicos disse que o diploma aprovado pela Assembleia da República que regula a prática da eutanásia deve ser enviado para o Tribunal Constitucional, para verificar se as objeções levantadas no anterior diploma “foram acolhidas”.

“Se já houve uma primeira declaração de inconstitucionalidade de um projeto anterior, compete ao Tribunal Constitucional agora verificar se as suas objeções foram acolhidas”, afirmou Inês Quadros em declarações à Agência ECCLESIA e à Renascença.

Para a professora da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, o envio para o Tribunal Constitucional “é a hipótese que o presidente da República deveria seguir”.

As declarações da vice-presidente da Associação de Juristas Católicas foram feitas na entrevista conjunta à Renascença e Ecclesia, realizada no contexto do Dia Internacional dos Direitos Humanos e que é divulgada no próximo domingo, onde afirma que o novo projeto “alarga mais do que restringe as situações de eutanásia”.

Para Inês Quadros, há “razões diferentes para a inconstitucionalidade”, nomeadamente pelo facto de o novo diploma ter abandonado a designação de “doença fatal”, referindo agora “doença grave e incurável”, o que “permite que se trate de uma situação que poderia até ser compatível com a vida durante muito tempo”.

“Perante um horizonte tão alargado, não se exclui que possa haver avanço científico suficiente que permitisse a cura e a regeneração da pessoa. É disto que estamos a falar.  Portanto, parece-me que o Tribunal Constitucional tem mais do que espaço para se pronunciar e tem, no fundo, todos os elementos que precisa para se pronunciar”, afirmou.

A vice-presidente da Associação de Juristas Católicos disse ainda que, se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela inconstitucionalidade, o diploma regressa à Assembleia da República e, finalmente, “o Presidente da República conserva sempre o direito de veto político”.

“Todo este todo este processo pode vir a estender-se no tempo e continua a esperança que de facto a lei não venha a entrar em vigor”, afirma Inês Quadros.

Para professora de Direito, “a pessoa num sofrimento grande o que pede é para deixar de sofrer, não é para morrer”, sendo necessário que se fortifiquem as condições de prestação de cuidados de saúde.

“Num momento em que assistimos à degradação diária dos cuidados de saúde nas questões mais elementares, com pessoas que morrem à espera de ser atendidas nas urgências, no momento em que os cuidados de saúde estão assim, em que toda a gente hesita antes de ir ao hospital, como é que se oferece como possibilidade a morte?”, questionou.

A Assembleia da República aprovou hoje em votação final global um diploma sobre a regulação da prática da eutanásia, que será agora apreciado pelo presidente da República Portuguesa.

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