O dedo polegar dos jovens

Pelo Pe. José Júlio Rocha

Dezoito anos incompletos e o Paulo já tem barba. Uma barba razoavelmente rija, abaixo de um cabelo cortado a pente 4. Calças de ganga, daquelas que já estão rotas antes de compradas, e uma blusa casual, com o capuz a pender pelas costas abaixo. É um millenial, com as características comuns a esta geração nova, em cima de uns sapatos 45, abaixo do metro e noventa, mas pouco.

Tem um smartfone chinês, que nunca larga, inclinado sobre o ecrã, a desbobinar gestos velozes com o polegar, a cabeça inclinada sobre o telemóvel, provavelmente terá problemas na cervical, de tanto pender o pescoço. O Paulo é tímido, muito tímido, característica que, a meu ver, se vem acentuando cada vez mais na nossa juventude e eu não sei se essa timidez é fruto dos meus olhos, cada vez mais afastados em idade dessa juventude, para quem não passo de um cota, ou se é uma timidez provocada pelo excesso de ecrãs, pelo ficar demasiado tempo fechado no mundo virtual e longe da realidade.

No meu tempo (expressão preciosa!), as discussões com os pais nasciam essencialmente do facto de querermos chegar a casa depois da meia-noite. Hoje, os millenials quase não saem. Saem pelos ecrãs adentro. Saem para um mundo virtual: vejo o mundo todo sem deixar o meu quarto.

“Esta juventude está perdida”, diz a geração mais velha, que também esteve perdida no seu tempo. E sempre esteve perdida. Graças a Deus. Já Sócrates, o filósofo grego, dizia que os jovens do seu tempo eram mal comportados, desprezavam a autoridade, não tinham respeito pelos mais velhos, contradiziam os pais e tiranizavam os mestres.

Esse olhar desconfiado dos adultos para com os jovens é eterno, tem a ver com a nossa própria configuração humana, dizia mesmo animal: são eles que nos vão tirar o lugar, e nós agimos como os leões dominantes, que não suportam os leões mais novos à volta do bando. A juventude está sempre perdida.

O problema é que hoje a juventude já não parece tão perdida. Já não são os rebeldes de outros tempos, ou, se o são, são-no sem causa, são rebeldes porque são, porque lhes está no sangue, mas não querem mudar o mundo. Noutros tempos, a juventude mobilizava-se para desassossegar a sociedade, para transformar o mundo, noutros tempos a juventude sonhava. A nossa civilização foi apagando os sonhos da juventude com promessas de

satisfação imediata. “Queres mudar o mundo? Não te apoquentes. Toma lá uma Playstation e não te preocupes com o mundo. Tens uma causa? Esquece as causas, e entretêm-te no mundo virtual das redes sociais e dos telemóveis. Não penses no futuro: nós pensamos por ti”.

No meu tempo (outra vez!), não tínhamos nada. Meia dúzia de escudos na algibeira, um monte de ideias na cabeça e uma vontade enorme de sair, de crescer, um futuro enorme e risonho. Hoje, a juventude tem tudo. Muito mais do que precisa. Mas roubaram-lhe o futuro. Os nossos jovens têm medo de crescer, o Amanhã parece um bocado tenebroso, sem grandes perspetivas de trabalho ou de projetos. O Amanhã representa medo e insegurança, não só para os jovens.

Aqui há uns anos, um catequista da minha paróquia disse aos alunos que Cristo tinha morrido para nos salvar. Um dos catequizandos, adolescente, replicou: “para nos salvar de quê?” É uma provocação tremenda, que situa a nossa juventude numa ausência desoladora de Jesus. Que Cristo para estes jovens? O mesmo de sempre, dir-me-ão. Mas como fazê-Lo entrar no coração destas gerações tão diferentes da nossa? Como dizer que Ele é a Resposta que nós precisamos, quando os jovens não querem respostas?

O Papa Francisco está no Panamá, para as Jornadas Mundiais da Juventude. Para além do colorido típico dessas manifestações de massa, ficarão as suas palavras. Certamente de esperança, que é típica dos jovens mas que, por agora, lhes está fazendo tanta falta.

Entretanto, converso com o Paulo que, sem deixar de me responder, tem dificuldades em tirar os olhos do seu telemóvel. O polegar agita-se pelo vidro acima e abaixo. Esta gente nova tem um coração de uma generosidade enorme e nós não conseguimos comunicar com ele. Gerações estanques. Hoje, a palavra diálogo, um dos termos fundamentais da minha juventude, entrou em decadência. Virão dias melhores.

Scroll to Top