Quando a Igreja é jovem

Pelo Pe Hélder Miranda Alexandre

No momento em que uma estrela apareceu em Belém, a Judeia estava obscurecida, era uma terra ocupada. Sessenta anos antes um exército estrangeiro tinha conquistado a Palestina, reclamando-a como província romana. O império conseguiu ultrapassar fronteiras, organizando cidades, leis e construindo novas vias. Contudo, Roma já não era jovem, era decadente. A república de Cícero degenerou no despotismo de César. O estado de bem estar, à força da conquista e do trabalho escravo, comprou a lealdade de um povo. A liberdade fora trocada por uma vida mais cómoda, aparentemente mais próspera.

No seio desta decadência e de paz podre, o Evangelho de Jesus Cristo abriu horizontes, encheu de esperança os corações dos débeis, dos pobres, das crianças, dos enfraquecidos. A acendalha do Pentecostes inflamou todo o império e em duas décadas chegou às portas de César.

À luz da História, as conquistas da Igreja Primitiva tornaram-se conquistas da Humanidade. Ultrapassou em muito os sonhos dos Doze. Contra perseguições, heresias, divisões de fora e de dentro, ela nasce cheia de vigor. Estende-se, contagia, na força do Espírito de Deus. Bonum difusivum sui. Para isso muito contribuiu a santidade e sabedoria dos Padres da Igreja, dos Mártires, dos Papas e dos Concílios e duma inumerável legião de crentes. Contudo, a riqueza desta História não se esgotou nesses primeiros séculos. Continua num tesouro que nos surpreende a cada momento. E nada menos que em 2000 anos! “Um mundo do qual o Evangelho tivesse sido banido seria certamente um mundo em que muitos mais milhões dos nossos semelhantes ficariam sem alimento, cuidados de saúde, abrigo e educação” (David Hart, Ilusões dos Ateus, Braga 2016, 34).

No entanto, esta História foi também manchada pela fragilidade humana. O que num primeiro momento parece ser decadência dá lugar a crises, que não são mais do que crescimento. O Concílio Vaticano II foi um dos momentos altos da História recente. Os novos ares do Espírito Santo rebentaram com fixismos e cristalizações. E isso não foi fácil.

Nunca a Igreja atingiu números tão expressivos como os de hoje. Mais de mil milhões de crentes! E isso é a força do Espírito Santo. Mas o mais impressionante é que ela se torna jovem e dinâmica a cada momento, sobretudo quando é mais perseguida. Segundo um estudo do ‘Center for Study of Global Christianity’, em 2016 houve 90 mil cristãos mortos e cerca de 500 milhões sofreram limitações à sua liberdade religiosa. Assim sendo, os mártires dos primeiros séculos não têm comparação – em quantidade – com o que se passa nestes últimos tempos.

O recente filme “Silence” de Martin Scorsese, baseado no romance homónimo de Shusako Endo, faz estremecer a fragilidade da nossa fé ocidental. Coloca questões pertinentes relativas à inculturação da mesma e da relação entre fé e caridade. Por isso, os números podem ser enganadores. Estamos adormecidos? Diria que em parte sim, e em parte não. Tudo depende do lugar que se dá à juventude da alma e onde trabalha o Espírito Santo. O Padre Rodrigues morreu com a cruz nas mãos e isso quer dizer tudo! Quer dizer que a Igreja não é aquilo que se mede, mas é Reino, é grão de mostarda! Quer dizer que por isso mesmo ela é jovem como no princípio. Renasce quando menos esperamos e isso não depende da minha genialidade ou santidade de vida, mas da simples ação gratuita de Deus! Assim acontece cultura, porque cultivada pela graça divina!

 

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