Sociedade é “fortemente ’desigrejada’”, mas não é “ateísta”, afirma Tomás Halík

O sacerdote checo Tomás Halík afirma no livro “O Tempo das Igrejas Vazias” que a sociedade é “fortemente ’desigrejada’”, mas não é “ateísta”, e considera a “pastoral categorial” como a expressão do “serviço da Igreja à sociedade”.

“Reconheço o papel da ‘pastoral categorial’ como vanguarda do futuro serviço da Igreja à sociedade no seu todo, o serviço dos capelães nos hospitais, nas forças armadas, nas prisões e nas universidades: estão ali não só como missionários clássicos e não apenas para as ‘ovelhas do seu rebanho’, estão ali para todos”, afirma no livro publicado em Portugal pela Paulinas Editora.

Ao analisar o fenómeno religioso no seu país, o sacerdote checo lembra que “cada pessoa tem uma dimensão espiritual da sua personalidade” e coloca a si própria “questões de cariz espiritual”, enquanto “buscadores espirituais”, “não encontram respostas nas Igrejas e, hoje, já nem as esperam delas”.

“A sociedade checa é fortemente ‘desigrejada’, mas não é ateísta. O maior número de pessoas que não pertencem às Igrejas são os «apateístas» (pessoas indiferentes à religião como a imaginam ou como a conheceram) e ainda os «buscadores espirituais», os que creem ‘à sua maneira’”, afirma Tomás Halík.

O professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade Carolina de Praga afirma que a pandemia mostrou “que em certas situações até as pessoas que eram indiferentes à religião ou que se distanciavam da ‘religião organizada’ ficam, de repente, sensíveis a temas espirituais e têm interesse em saber o que os cristãos dizem nesses momentos”.

Para Tomás Halík, a “secularização não consiste numa crise das certezas religiosas, mas de uma crise geral de certezas dos indivíduos de hoje”, “certezas religiosas e seculares”, e as estruturas religiosas precisam de “perceber que a reforma necessária não pode ser um simples esforço por uma modernização fácil”.

“As tentativas kitsch de adaptar comercialmente a religião ao estilo ‘da sociedade de entretenimento’ existem na Igreja em abundância e são tão estéreis como as tentativas de ignorar a evolução histórica e imitar a Igreja dos tempos passados”, afirma o sacerdote.

Tomás Halík considera que “a tentativa de plagiar a piedade popular de uma sociedade pré-moderna, que há muito perdeu o seu contexto histórico-cultural, ou de organizar festas litúrgicas barrocas, gera, na melhor das hipóteses, um folclore para turistas, mas mais frequentemente dá origem a um embaraço lamentável”.

“Nenhuma ‘nova evangelização’ trará frutos se não for precedida por uma ‘pré-evangelização’, na forma de um cuidado sistemático pela cultura espiritual dos indivíduos e da sociedade”, afirmou.

O sacerdote checo constata que no seu país as “autoridades da Igreja ficaram, em grande parte, em silêncio” durante a pandemia, alerta para “uma série de erros” cometidos pelos líderes do Estado e valoriza iniciativas “ao nível dos municípios” e dos cidadãos e de “pequenos grupos de leigos cristãos”, comprovando a “sua vitalidade e eficácia”.

Tomás Halík afirma que viveu o “jejum forçado da Eucaristia” como  uma “manifestação rara da pedagogia de Deus” e uma oportunidade para refletir sobre “o sentido da Eucaristia” no quotidiano e afirma que “se para muitos católicos a ida à missa dominical era um dos principais pilares da sua identidade cristã, agora terão de se questionar sobre o que pode ser uma nova e mais profunda fonte da sua vida de fé”.

“Receio que, se a Igreja não levar a sério os apelos urgentes do Papa Francisco por uma reforma interna, por uma viragem radical para o Evangelho, por um aprofundamento da sua teologia, espiritualidade e prática pastoral, este tempo de igrejas vazias possa tornar-se uma imagem de advertência num futuro próximo”, alertou.

O livro “O tempo das Igrejas Vazias” reúne as homilias da Quaresma e da Páscoa de 2020 gravadas pelo sacerdote checo na “paróquia universitária”, no seguimento do diálogo interdisciplinar promovido por Tomás Halík na Universidade de Praga.

Para a diretora da Paulinas Editora, irmã Eliete Duarte, a publicação do mais recente livro de Tomás Halík inscreve-se no projeto de colocar à disposição dos leitores, em português, as obras do sacerdote checo, o que acontece desde 2013, e constitui um “contributo muito grande para repensar a Igreja” e para a “reflexão que é preciso fazer” no contexto da pandemia Covid-19.

(Com Ecclesia)

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